Simulação: Decisão do Ministério das Finanças
Simulação: Decisão do Ministério das Finanças
Para efeitos introdutórios, iremos abordar cada uma das propostas, analisando vantagens e desvantagens, para, de seguida, conseguirmos dar uma decisão fundamentada, bem como um projeto dos traços de um diploma final.
1. Privatização
1.1. Vantagens da privatização da Caixa Geral de Depósitos, dadas pelo grupo
- Reduzir o peso do Estado na economia. Será que isso é mesmo uma vantagem? Remover ao Estado a oportunidade de intervir no sector bancário, procurando a estabilidade deste mercado? Não nos parece;
- Reduzir o peso da dívida pública na economia. Efetivamente, seria uma poupança de dinheiro pelo Estado, que poderia ser aplicado noutro sector;
- Aumentar a competitividade da CGD. É certo que um privado, por prosseguir o lucro, vai querer tornar a Caixa mais eficiente e competitiva. Mas será que não será esse lucro também do interesse do Estado? No entanto, admite-se a dificuldade do mesmo em conciliar a prossecução do interesse público e o fim lucrativo, pelo que a melhor solução seria uma intervenção do Estado juntamente com a de um privado, existindo assim duas entidades reguladoras da caixa;
- Amortizar-se a divida pública. Não tanto amortizar a dívida pública, mas sim reduzir a sua expansão;
- Amortizar a dívida Publica do setor empresarial do Estado. Já está incluído no ponto anterior;
- Novas aplicações de capital no setor produtivo. Realmente, disponibilizar-se-ia uma verba significativa no Orçamento de Estado, que poderia ser utilizada noutras áreas. Verba de 5 900 000 000 (art.5º/nº1 dos estatutos da CGD).
1.2. Pontos defendidos pela Comissão Europeia, quanto à privatização da CGD
- “Uma racionalização mais profunda do banco, possivelmente acompanhada por passos concretos para a sua privatização total, poderia ter ajudado a reduzir os riscos contingentes para o Estado e a aumentar a concorrência no setor bancário”;
- Aumentar a resiliência da banca, desligando o seu acesso ao mercado ao do Estado e reduzir a sua dependência do financiamento do Euro sistema, ao mesmo tempo garantindo que se evitava um ‘credit crunch’ [falta de crédito]”;
1.3. Críticas à Privatização da Caixa Geral de Depósitos
- Um privado prossegue um interesse privado, e não o interesse público. Quem defende o interesse público é o Estado;
- A venda da Caixa, resultaria num alívio quanto ao seu custo anual no orçamento de Estado, mas não originaria uma quantia assim tão significativa, quanto ao custo de venda, visto que este negócio, tendo em conta o estado financeiro da Caixa, não seria apelativo a um privado, a menos que o Estado aceitasse efetuar a venda por um preço menor ao seu real valor de mercado;
- O facto de existir um banco a domínio do Estado é de extrema importância para que este posso intervir no mercado bancário de forma a manter, inclusive, a estabilidade deste setor. Ora, se todos os bancos fossem privados, e o Estado não tivesse uma palavra a dizer neste mercado, a competitividade bancaria poderia trazer uma instabilidade perigosíssima para este frágil mercado, deixar cair a banca significaria o colapso económico. O Estado deve intervir com dinheiro dos contribuintes para o crédito às pessoas e às empresas não secar completamente;
- A propriedade dos bancos pelo Estado é preferível às sucessivas e custosas intervenções estatais no sector. Aliás, tivemos o exemplo disso há pouco tempo com o BES.
2. Entidade Pública Empresarial
Uma possível transformação da CGD em Entidade Pública Empresarial, onde os capitais são exclusivamente públicos, designados pela lei como «capital estatutário», faria com que o Estado tomasse o poder de toda a atividade económica da caixa. Transformando-a numa E.P.E., passaria a integrar o setor público empresarial do Estado estando, portanto, sujeita ao seu regime (DL 133/2013), sem prejuízo da aplicação do Direito Privado, nomeadamente o C.S.C. No entanto, esta exclusividade de capitais públicos canalizados para fazer funcionar a máquina económica que é a banca pode ser uma carga excessiva do Estado na economia do país.
Esta natureza jurídica alternativa faria com que a CGD se encontrasse completamente dependente das opções governamentais estando sujeita aos poderes típicos de superintendência e de tutela por parte do Estado, principalmente por via do Ministério das Finanças e da Inspeção Geral de Finanças. Estaria ainda, obviamente, sujeita a um controlo jurisdicional por parte do Tribunal de Contas, ao qual teria de prestar contas.
A missão primordial da CGD enquanto E.P.E. seria o exercício da atividade bancária, tendo em vista a prossecução do interesse público, por meio a dar cumprimento às tarefas do próprio Estado. O que, de um modo inevitável, acabaria por afastar a ideia principal de uma atividade empresarial, que é a maximização do lucro como resultado último da sua atividade.
Atualmente a CGD é uma S.A. de capitais exclusivamente públicos, sendo esse o primeiro passo para o processo de total privatização de uma entidade. Deste modo, não há dúvida que a transformação da CGD em E.P.E. afastaria por completo essa possibilidade, permanecendo e bem, como uma empresa pública.
O excessivo controlo e fiscalização que é aplicado às E.P.E. ‘s tanto pode ser visto como uma vantagem ou como um inconveniente. Por um lado, aumenta a segurança jurídica e a proteção dos cidadãos, através do controlo da legalidade e do próprio mérito da CGD, assegurando assim o interesse público, os direitos subjetivos e os interesses legalmente protegidos o que é, sem dúvida, vantajoso. No entanto, por outro lado, esse excesso pode facilmente originar um enorme procedimento burocrático, o que irá limitar a eficiência e a eficácia da gerência, o que resultaria na possibilidade de se atingir um ponto de má administração, acabando por provocar uma certa debilidade na obtenção dos resultados a atingir.
2.1. Vantagens do regime
- A prossecução do interesse público enquanto missão;
- Cancelamento do processo de privatização (afastamento do regime de S.A.);
- Poderes de autoridade típicos da Administração Pública;
- Proteção dos direitos subjetivos, interesses legalmente protegidos e interesse público.
2.2 Desvantagens
- Não se procura a maximização do lucro empresarial;
- Peso excessivo do Estado na economia;
- Pode originar uma má administração o que acabaria por provocar uma debilidade nos resultados pretendidos;
- Criação inevitável de um sistema excessivamente burocrático.
3. Sociedade de Capitais Mistos
Uma vez analisado o regime de privatização e o regime de entidade pública empresarial, cabe agora analisar o meio termo entre estes, que consiste num regime de sociedade de capitais mistos.
A instituição teria tanto uma missão económico-financeira, como uma missão social. Em relação à detenção do capital social da empresa, existe tanto uma parcela pública, pelo facto de o Estado deter grande parte do capital social (ao contrário de deter todo o capital, como no regime das E.P.E.) como uma parcela privada, pela detenção de capital por parte de entes privados (em vez de todo, como na privatização).
A proteção do interesse público da empresa e o controlo desta é realizada através da influência dominante do Estado, referida no artigo 9º do D.L. 133/2013, de 3 de outubro. Assim, ainda que sem uma maioria de capital, o Estado pode exercer os poderes de superintendência e tutela (através das outras previsões presentes no artigo 9º/1). Deste modo, existe uma atuação mais alargada dos entes privados. O Estado interfere apenas em situações mais importantes da vida da empresa, como a definição de certos objetivos, criados sobre a relação de superintendência com a empresa, e com a tutela que exerce sobre a mesma (concretizada, por exemplo pela sujeição ao controlo pelo tribunal de contas, como refere o artigo 26º/1 do diploma referido anteriormente). Sumariamente, e como referiu a equipa que apresentou tal proposta, existe autonomia (de gestão), mas não independência.
O plano aqui é o de, em vez de privatizar a empresa e receber um montante avultado de uma só vez, o que tem benefícios no curto prazo, desenvolver uma empresa, autorizando a entrada de capital privado, de modo a que se torne sustentável e lucrativa (benefícios no longo prazo), ainda que não seja totalmente ou maioritariamente estadual.
3.1 Vantagens
- Diminuição de encargos estaduais (ou seja, despesas com a empresa, incluindo recapitalizações), ainda que existentes;
- A entrada dos privados traz competitividade à empresa, dando melhor prossecução ao fim lucrativo da empresa (evitando em certos a falência e o prejuízo);
- A atuação E a influência do Estado ainda se encontram presente, por força da influência dominante, ainda que num sentido mais limitado do que nas E.P.E.’s;
- Existe uma maior fiscalização e uma melhor ligação ao setor do que haveria se se tratasse de um mercado na sua totalidade privado;
- A privatização parcial de uma empresa totalmente pública, tanto assegura benefícios no curto prazo, dada a receita resultante venda, como no longo prazo, pela possibilidade de a empresa se tornar lucrativa e contribuir para a sustentabilidade das contas públicas.
3.2. Desvantagens
- Esta dupla missão de prossecução do interesse público/lucro pode muitas vezes ser incompatível, visto que o interesse público pode prejudicar a lucratividade da empresa, e vice-versa;
- A falta de escrutínio público torna-se rapidamente uma falta de transparência perante os particulares;
- Os lucros, uma vez que foram conseguidos por uma atuação por parte do Estado e dos privados, terão de ser repartidos pelos dois. Deste modo, o Estado nunca consegue a totalidade dos lucros da CGD.
3. Decisão e Fundamentação
Os dados provenientes do relatório do FMI viabilizam destacar alguns riscos sistémicos que atingem a banca portuguesa e consistem em problemas legados por empréstimos altamente depreciativos, sobretudo entre as pequenas e médias empresas – o FMI relaciona este problema com a falta de crescimento e acrescenta que por causa do crédito malparado muitas empresas não estão em posição de investir porque os bancos estão relutantes em emprestar-lhes mais dinheiro, perpetuando deste modo um ciclo vicioso de crédito malparado, alavancagem excessiva e baixo crescimento. O fundo recomenda o esforço centralizado de aumentar os respetivos capitais numa tentativa de erradicar a dívida má e estender o financiamento a novas empresas. Adiante – no ponto 19 – os técnicos expressam algumas preocupações com a desconfiança sentida pelos investidores suscitadas pelas necessidades significativas de financiamento do maior banco português – estimadas em 3 % do PIB – e que poderão ser indicadores de mais problemas de crédito malparado noutros bancos nacionais. Outra fonte de incerteza reside na dimensão das perdas que os outros bancos irão suportar caso o atual processo de negociação da venda do Novo Banco fique aquém das expetativas: a injeção de 3.9 mil milhões de euros operada pelo Estado há uns meses atrás – 2.2 % do PIB – teria de ser reposta pelas restantes agências bancárias. Como resposta o FMI propõe uma abordagem compreensiva da dívida contraída – valorizando e vendendo adequadamente o crédito mau – apoiada por mais aumentos de capitais e provisões. Além disto os bancos devem reduzir os custos operacionais e melhorar a gestão interna de modo que as decisões relativas a empréstimos sejam estritamente orientadas pelo critério comercial. As soluções para os desafios que os bancos portugueses enfrentam terão de ser encontradas a nível nacional com recurso aos poderes de regulação existentes.
A nossa abordagem consiste na conversão do banco público numa sociedade de capitais mistos, na qual o Estado, não sendo acionista maioritário, possui direitos especiais de controlo, exercendo influência dominante sob a empresa – artigo 9º, nº1, do DL nº 133/2013, de 3 de outubro. Terá a denominação de empresa pública de direito privado, com a designação de sociedade anónima (SA), e será vocacionada para o desenvolvimento económico e social, servindo também de complemento ao restante setor bancário.
Por toda a história europeia é possível determinar a preponderância do setor bancário na restauração da prosperidade económica com muitas das autoridades públicas europeias a desempenharem um papel ativo através da criação de bancos públicos ou semi-públicos. Os efeitos positivos desta intervenção repercutiram-se não só nas classes média e baixa – ao garantir-lhes o acesso a empréstimos e depósitos – mas também na economia do país através do financiamento de grandes obras públicas que não teriam sido possíveis sem o apoio financeiro do estado. Atualmente as razões que justificam a existência de bancos públicos e as suas missões estão intimamente relacionadas com as características do sistema bancário em concreto e com as insuficiências demonstradas. Tais insuficiências não redundam obrigatoriamente na criação dum banco público contanto que existem várias formas de intervenção estatal: se dado bem ou serviço apresentar baixos níveis de oferta fundamentados em perspetivas exclusivamente mercantis as autoridades públicas podem impor a sua provisão por lei ou subcontratá-la à autonomia privada. Contudo, e enfatizando o incentivo maximizador de lucro dos contratantes privados, a intervenção pública direta é preferível em setores cuja meta mercantil conduza à deterioração da qualidade do serviço providenciado. A regulação também pode constituir uma solução para este tipo de falhas de mercado, mas pode aduzir resultados inferiores comparativamente ao banco público devido ás assimetrias informativas presentes entre regulado e regulador.
A intervenção pública na forma dum banco permite ainda mitigar externalidades negativas – como os riscos sistémicos, as assimetrias informativas ou o escoamento de capitais para regiões mais ricas – e catalisar algumas externalidades positivas que não se enquadrem no escopo dos interesses privados: os benefícios sociais decorrentes de domínios ambientais, culturais e recreativos – por exemplo o desporto – não são viáveis para a parte privada sendo bastante provável que projetos desta natureza sem retorno financeiro não obtenham qualquer financiamento: na realidade que daí adviria alguns requisitos do Estado Social e de Bem-Estar deixariam de estar preenchidos.
Não obstante a evidente degradação das finanças públicas e o montante despendido nas recentes operações de injeção de capital público (3 % do PIB) na CGD defendemos que esta é a solução que melhor traduz os custos e os benefícios do banco semi-público na economia nacional quer através de potenciais estímulos ao fraco crescimento apresentado quer fazendo face aos eventuais colapsos apontados no relatório. Na opção pela sociedade mista para o desenvolvimento e investimento convergem ainda interesses privados comerciais e causas públicas sociais nomeadamente nas atribuições referidas nas alíneas b), c) e d), do número 1, do artigo supramencionado. Amarrados aos critérios da lógica socializante e relevada a utilidade histórica, económico-financeira e social dos serviços bancários a decisão não poderia nunca conter uma solução que privatizasse tal interesse.
5: Projeto de diploma final
Uma vez tomada a decisão, cabe agora, baseando-nos na proposta apresentada pela equipa da sociedade de capitais mistos, enquadrar juridicamente a CGD sob o regime escolhido.
Forma da entidade a adotar
- Sociedade de capitais mistos, como pessoa coletiva de direito privado(S.A.) com ou sem maioria de capital público (exercendo-se a posição predominante através da influência dominante).
Características
- Estaríamos perante uma empresa pública sob forma privada, inserindo-se, portanto, na administração indireta do Estado.
- Em termos de regime aplicar-se-ia o Código das Sociedades Comerciais, uma vez que se trata de uma sociedade comercial de direito privado e o D.L. 133/2013, de 3 de outubro, respeitante ás empresas públicas. Existe ainda uma obrigação de obediência ás regras da concorrência, uma vez que esta concorre em paridade com estas.
- Acerca das atribuições, seriam as seguintes:
- Missão económico-financeira, ou seja, a procura do lucro e da sustentabilidade da empresa;
- Missão social, através do financiamento de empresas portuguesas, instituições sociais
- Pode ainda empreender outras atividades financeiras, designadamente a gestão do tesouro, a gestão de risco ou a consultadoria, desde que estejam diretamente relacionadas com a prossecução da atribuição acometida.
- Em matéria de competências, manter-se-ia o quadro de competências presente nos estatutos atuais da CGD:
- Assembleia Geral – artigo 14º;
- Conselho de Administração – artigo 20º, 21º;
- Conselho Fiscal – artigo 29º.
Poderes governamentais sobre a empresa
- O Estado exerceria funções de superintendência (fixação de objetivos) e tutela (de legalidade e de mérito).
Poderes de autoridade exercidos pela empresa
- Presentes no artigo 22º do D.L. 133/2013.
Realizado por:
- Francisco Caetano
- Tomás Duarte
- André Alves
- Tiago Costa