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Subturma 10 no Divã da Psicanálise

Blog de Direito Administrativo. 2º Ano - Turma B, Subturma 10 (2016/2017).

Subturma 10 no Divã da Psicanálise

Blog de Direito Administrativo. 2º Ano - Turma B, Subturma 10 (2016/2017).

Simulação: Decisão do Ministério das Finanças

Simulação: Decisão do Ministério das Finanças

              

               Para efeitos introdutórios, iremos abordar cada uma das propostas, analisando vantagens e desvantagens, para, de seguida, conseguirmos dar uma decisão fundamentada, bem como um projeto dos traços de um diploma final. 

 

1.        Privatização

1.1.        Vantagens da privatização da Caixa Geral de Depósitos, dadas pelo grupo

 

- Reduzir o peso do Estado na economia. Será que isso é mesmo uma vantagem? Remover ao Estado a oportunidade de intervir no sector bancário, procurando a estabilidade deste mercado? Não nos parece;

- Reduzir o peso da dívida pública na economia. Efetivamente, seria uma poupança de dinheiro pelo Estado, que poderia ser aplicado noutro sector;

- Aumentar a competitividade da CGD. É certo que um privado, por prosseguir o lucro, vai querer tornar a Caixa mais eficiente e competitiva. Mas será que não será esse lucro também do interesse do Estado? No entanto, admite-se a dificuldade do mesmo em conciliar a prossecução do interesse público e o fim lucrativo, pelo que a melhor solução seria uma intervenção do Estado juntamente com a de um privado, existindo assim duas entidades reguladoras da caixa;

- Amortizar-se a divida pública. Não tanto amortizar a dívida pública, mas sim reduzir a sua expansão;

- Amortizar a dívida Publica do setor empresarial do Estado. Já está incluído no ponto anterior;

- Novas aplicações de capital no setor produtivo. Realmente, disponibilizar-se-ia uma verba significativa no Orçamento de Estado, que poderia ser utilizada noutras áreas. Verba de 5 900 000 000 (art.5º/nº1 dos estatutos da CGD).

 

1.2.        Pontos defendidos pela Comissão Europeia, quanto à privatização da CGD

 

- “Uma racionalização mais profunda do banco, possivelmente acompanhada por passos concretos para a sua privatização total, poderia ter ajudado a reduzir os riscos contingentes para o Estado e a aumentar a concorrência no setor bancário”;

- Aumentar a resiliência da banca, desligando o seu acesso ao mercado ao do Estado e reduzir a sua dependência do financiamento do Euro sistema, ao mesmo tempo garantindo que se evitava um ‘credit crunch’ [falta de crédito]”;

 

1.3.        Críticas à Privatização da Caixa Geral de Depósitos

 

- Um privado prossegue um interesse privado, e não o interesse público. Quem defende o interesse público é o Estado;

- A venda da Caixa, resultaria num alívio quanto ao seu custo anual no orçamento de Estado, mas não originaria uma quantia assim tão significativa, quanto ao custo de venda, visto que este negócio, tendo em conta o estado financeiro da Caixa, não seria apelativo a um privado, a menos que o Estado aceitasse efetuar a venda por um preço menor ao seu real valor de mercado;

- O facto de existir um banco a domínio do Estado é de extrema importância para que este posso intervir no mercado bancário de forma a manter, inclusive, a estabilidade deste setor. Ora, se todos os bancos fossem privados, e o Estado não tivesse uma palavra a dizer neste mercado, a competitividade bancaria poderia trazer uma instabilidade perigosíssima para este frágil mercado, deixar cair a banca significaria o colapso económico. O Estado deve intervir com dinheiro dos contribuintes para o crédito às pessoas e às empresas não secar completamente;

- A propriedade dos bancos pelo Estado é preferível às sucessivas e custosas intervenções estatais no sector. Aliás, tivemos o exemplo disso há pouco tempo com o BES.

 

2.       Entidade Pública Empresarial

 

Uma possível transformação da CGD em Entidade Pública Empresarial, onde os capitais são exclusivamente públicos, designados pela lei como «capital estatutário», faria com que o Estado tomasse o poder de toda a atividade económica da caixa. Transformando-a numa E.P.E., passaria a integrar o setor público empresarial do Estado estando, portanto, sujeita ao seu regime (DL 133/2013), sem prejuízo da aplicação do Direito Privado, nomeadamente o C.S.C. No entanto, esta exclusividade de capitais públicos canalizados para fazer funcionar a máquina económica que é a banca pode ser uma carga excessiva do Estado na economia do país.

               Esta natureza jurídica alternativa faria com que a CGD se encontrasse completamente dependente das opções governamentais estando sujeita aos poderes típicos de superintendência e de tutela por parte do Estado, principalmente por via do Ministério das Finanças e da Inspeção Geral de Finanças. Estaria ainda, obviamente, sujeita a um controlo jurisdicional por parte do Tribunal de Contas, ao qual teria de prestar contas.

               A missão primordial da CGD enquanto E.P.E. seria o exercício da atividade bancária, tendo em vista a prossecução do interesse público, por meio a dar cumprimento às tarefas do próprio Estado. O que, de um modo inevitável, acabaria por afastar a ideia principal de uma atividade empresarial, que é a maximização do lucro como resultado último da sua atividade.

               Atualmente a CGD é uma S.A. de capitais exclusivamente públicos, sendo esse o primeiro passo para o processo de total privatização de uma entidade. Deste modo, não há dúvida que a transformação da CGD em E.P.E. afastaria por completo essa possibilidade, permanecendo e bem, como uma empresa pública.

               O excessivo controlo e fiscalização que é aplicado às E.P.E. ‘s tanto pode ser visto como uma vantagem ou como um inconveniente. Por um lado, aumenta a segurança jurídica e a proteção dos cidadãos, através do controlo da legalidade e do próprio mérito da CGD, assegurando assim o interesse público, os direitos subjetivos e os interesses legalmente protegidos o que é, sem dúvida, vantajoso. No entanto, por outro lado, esse excesso pode facilmente originar um enorme procedimento burocrático, o que irá limitar a eficiência e a eficácia da gerência, o que resultaria na possibilidade de se atingir um ponto de má administração, acabando por provocar uma certa debilidade na obtenção dos resultados a atingir.

 

2.1.        Vantagens do regime  

 

- A prossecução do interesse público enquanto missão;

- Cancelamento do processo de privatização (afastamento do regime de S.A.);

- Poderes de autoridade típicos da Administração Pública;

- Proteção dos direitos subjetivos, interesses legalmente protegidos e interesse público.

2.2 Desvantagens

 

- Não se procura a maximização do lucro empresarial;

- Peso excessivo do Estado na economia;

- Pode originar uma má administração o que acabaria por provocar uma debilidade nos resultados pretendidos;

- Criação inevitável de um sistema excessivamente burocrático.

 

3. Sociedade de Capitais Mistos

 

               Uma vez analisado o regime de privatização e o regime de entidade pública empresarial, cabe agora analisar o meio termo entre estes, que consiste num regime de sociedade de capitais mistos.

               A instituição teria tanto uma missão económico-financeira, como uma missão social. Em relação à detenção do capital social da empresa, existe tanto uma parcela pública, pelo facto de o Estado deter grande parte do capital social (ao contrário de deter todo o capital, como no regime das E.P.E.) como uma parcela privada, pela detenção de capital por parte de entes privados (em vez de todo, como na privatização).

               A proteção do interesse público da empresa e o controlo desta é realizada através da influência dominante do Estado, referida no artigo 9º do D.L. 133/2013, de 3 de outubro. Assim, ainda que sem uma maioria de capital, o Estado pode exercer os poderes de superintendência e tutela (através das outras previsões presentes no artigo 9º/1). Deste modo, existe uma atuação mais alargada dos entes privados. O Estado interfere apenas em situações mais importantes da vida da empresa, como a definição de certos objetivos, criados sobre a relação de superintendência com a empresa, e com a tutela que exerce sobre a mesma (concretizada, por exemplo pela sujeição ao controlo pelo tribunal de contas, como refere o artigo 26º/1 do diploma referido anteriormente). Sumariamente, e como referiu a equipa que apresentou tal proposta, existe autonomia (de gestão), mas não independência. 

               O plano aqui é o de, em vez de privatizar a empresa e receber um montante avultado de uma só vez, o que tem benefícios no curto prazo, desenvolver uma empresa, autorizando a entrada de capital privado, de modo a que se torne sustentável e lucrativa (benefícios no longo prazo), ainda que não seja totalmente ou maioritariamente estadual.

3.1 Vantagens

              

- Diminuição de encargos estaduais (ou seja, despesas com a empresa, incluindo recapitalizações), ainda que existentes;

- A entrada dos privados traz competitividade à empresa, dando melhor prossecução ao fim lucrativo da empresa (evitando em certos a falência e o prejuízo);

- A atuação E a influência do Estado ainda se encontram presente, por força da influência dominante, ainda que num sentido mais limitado do que nas E.P.E.’s;

- Existe uma maior fiscalização e uma melhor ligação ao setor do que haveria se se tratasse de um mercado na sua totalidade privado;

- A privatização parcial de uma empresa totalmente pública, tanto assegura benefícios no curto prazo, dada a receita resultante venda, como no longo prazo, pela possibilidade de a empresa se tornar lucrativa e contribuir para a sustentabilidade das contas públicas.

3.2. Desvantagens

 

- Esta dupla missão de prossecução do interesse público/lucro pode muitas vezes ser incompatível, visto que o interesse público pode prejudicar a lucratividade da empresa, e vice-versa;

- A falta de escrutínio público torna-se rapidamente uma falta de transparência perante os particulares;

- Os lucros, uma vez que foram conseguidos por uma atuação por parte do Estado e dos privados, terão de ser repartidos pelos dois. Deste modo, o Estado nunca consegue a totalidade dos lucros da CGD.

 

3.      Decisão e Fundamentação  

 

               Os dados provenientes do relatório do FMI viabilizam destacar alguns riscos sistémicos que atingem a banca portuguesa e consistem em problemas legados por empréstimos altamente depreciativos, sobretudo entre as pequenas e médias empresas – o FMI relaciona este problema com a falta de crescimento e acrescenta que por causa do crédito malparado muitas empresas não estão em posição de investir porque os bancos estão relutantes em emprestar-lhes mais dinheiro, perpetuando deste modo um ciclo vicioso de crédito malparado, alavancagem excessiva e baixo crescimento. O fundo recomenda o esforço centralizado de aumentar os respetivos capitais numa tentativa de erradicar a dívida má e estender o financiamento a novas empresas. Adiante – no ponto 19 – os técnicos expressam algumas preocupações com a desconfiança sentida pelos investidores suscitadas pelas necessidades significativas de financiamento do maior banco português – estimadas em 3 % do PIB – e que poderão ser indicadores de mais problemas de crédito malparado noutros bancos nacionais. Outra fonte de incerteza reside na dimensão das perdas que os outros bancos irão suportar caso o atual processo de negociação da venda do Novo Banco fique aquém das expetativas: a injeção de 3.9 mil milhões de euros operada pelo Estado há uns meses atrás – 2.2 % do PIB – teria de ser reposta pelas restantes agências bancárias. Como resposta o FMI propõe uma abordagem compreensiva da dívida contraída – valorizando e vendendo adequadamente o crédito mau – apoiada por mais aumentos de capitais e provisões. Além disto os bancos devem reduzir os custos operacionais e melhorar a gestão interna de modo que as decisões relativas a empréstimos sejam estritamente orientadas pelo critério comercial. As soluções para os desafios que os bancos portugueses enfrentam terão de ser encontradas a nível nacional com recurso aos poderes de regulação existentes.

               A nossa abordagem consiste na conversão do banco público numa sociedade de capitais mistos, na qual o Estado, não sendo acionista maioritário, possui direitos especiais de controlo, exercendo influência dominante sob a empresa – artigo 9º, nº1, do DL nº 133/2013, de 3 de outubro. Terá a denominação de empresa pública de direito privado, com a designação de sociedade anónima (SA), e será vocacionada para o desenvolvimento económico e social, servindo também de complemento ao restante setor bancário.

               Por toda a história europeia é possível determinar a preponderância do setor bancário na restauração da prosperidade económica com muitas das autoridades públicas europeias a desempenharem um papel ativo através da criação de bancos públicos ou semi-públicos. Os efeitos positivos desta intervenção repercutiram-se não só nas classes média e baixa – ao garantir-lhes o acesso a empréstimos e depósitos – mas também na economia do país através do financiamento de grandes obras públicas que não teriam sido possíveis sem o apoio financeiro do estado. Atualmente as razões que justificam a existência de bancos públicos e as suas missões estão intimamente relacionadas com as características do sistema bancário em concreto e com as insuficiências demonstradas. Tais insuficiências não redundam obrigatoriamente na criação dum banco público contanto que existem várias formas de intervenção estatal: se dado bem ou serviço apresentar baixos níveis de oferta fundamentados em perspetivas exclusivamente mercantis as autoridades públicas podem impor a sua provisão por lei ou subcontratá-la à autonomia privada. Contudo, e enfatizando o incentivo maximizador de lucro dos contratantes privados, a intervenção pública direta é preferível em setores cuja meta mercantil conduza à deterioração da qualidade do serviço providenciado. A regulação também pode constituir uma solução para este tipo de falhas de mercado, mas pode aduzir resultados inferiores comparativamente ao banco público devido ás assimetrias informativas presentes entre regulado e regulador.

               A intervenção pública na forma dum banco permite ainda mitigar externalidades negativas – como os riscos sistémicos, as assimetrias informativas ou o escoamento de capitais para regiões mais ricas – e catalisar algumas externalidades positivas que não se enquadrem no escopo dos interesses privados:  os benefícios sociais decorrentes de domínios ambientais, culturais e recreativos – por exemplo o desporto – não são viáveis para a parte privada sendo bastante provável que projetos desta natureza sem retorno financeiro não obtenham qualquer financiamento: na realidade que daí adviria alguns requisitos do Estado Social e de Bem-Estar deixariam de estar preenchidos.

           

                           Não obstante a evidente degradação das finanças públicas e o montante despendido nas recentes operações de injeção de capital público (3 % do PIB) na CGD defendemos que esta é a solução que melhor traduz os custos e os benefícios do banco semi-público na economia nacional quer através de potenciais estímulos ao fraco crescimento apresentado quer fazendo face aos eventuais colapsos apontados no relatório. Na opção pela sociedade mista para o desenvolvimento e investimento convergem ainda interesses privados comerciais e causas públicas sociais nomeadamente nas atribuições referidas nas alíneas b), c) e d), do número 1, do artigo supramencionado. Amarrados aos critérios da lógica socializante e relevada a utilidade histórica, económico-financeira e social dos serviços bancários a decisão não poderia nunca conter uma solução que privatizasse tal interesse.

 

5: Projeto de diploma final

 

               Uma vez tomada a decisão, cabe agora, baseando-nos na proposta apresentada pela equipa da sociedade de capitais mistos, enquadrar juridicamente a CGD sob o regime escolhido.

Forma da entidade a adotar

- Sociedade de capitais mistos, como pessoa coletiva de direito privado(S.A.) com ou sem maioria de capital público (exercendo-se a posição predominante através da influência dominante).

 

Características

               - Estaríamos perante uma empresa pública sob forma privada, inserindo-se, portanto, na administração indireta do Estado.

               - Em termos de regime aplicar-se-ia o Código das Sociedades Comerciais, uma vez que se trata de uma sociedade comercial de direito privado e o D.L. 133/2013, de 3 de outubro, respeitante ás empresas públicas. Existe ainda uma obrigação de obediência ás regras da concorrência, uma vez que esta concorre em paridade com estas.

               - Acerca das atribuições, seriam as seguintes:

                              - Missão económico-financeira, ou seja, a procura do lucro e da sustentabilidade da empresa;

                              - Missão social, através do financiamento de empresas portuguesas, instituições sociais

                              - Pode ainda empreender outras atividades financeiras, designadamente a gestão do tesouro, a gestão de risco ou a consultadoria, desde que estejam diretamente relacionadas com a prossecução da atribuição acometida.                                        

               - Em matéria de competências, manter-se-ia o quadro de competências presente nos estatutos atuais da CGD:

                              - Assembleia Geral – artigo 14º;

- Conselho de Administração – artigo 20º, 21º;

- Conselho Fiscal – artigo 29º.

 

Poderes governamentais sobre a empresa

               - O Estado exerceria funções de superintendência (fixação de objetivos) e tutela (de legalidade e de mérito).

 

               Poderes de autoridade exercidos pela empresa

                              - Presentes no artigo 22º do D.L. 133/2013.

 

Realizado por:

               - Francisco Caetano

- Tomás Duarte

- André Alves

- Tiago Costa

Princípios constitucionais sobre a Organização Administrativa

Princípios constitucionais sobre a Organização Administrativa

 

 

Dentro da teoria geral da organização administrativa, podemos notar que existe um conjunto de princípios constitucionais , em matéria de organização administrativa.

Na Constituição da República Portuguesa, nos termos do artigo 267º ,nº1 – “ A Administração Publica será estruturada de modo a evitar a burocratização , a aproximar os serviços das populações e a assegurar a participação dos interessados(…) por intermédio de associações publicas (…) e outras formas de representação democrática”- e nº2 –“(…) a lei estabelecerá adequadas formas de descentralização e desconcentração administrativas, sem prejuízo da necessária eficácia e unidade de ação da Administração e dos poderes de direção , superintendência e tutela dos órgãos competentes”.

Deste artigo , resultam cinco princípios :

  • Principio da desburocratização – Administração Publica deve ser organizada e deve funcionar de modo eficiente , de modo a facilitar a vida aos particulares , através da prossecução do interesse publico.

Este principio consta da Constituição e impõe à própria Administração uma renovação nas suas estruturas e métodos de funcionamento , para alcançar tal objectivo(interesse publico).

 

  • Principio da aproximação dos serviços às populações – Administração deve ser estruturada de modo a que os seus serviços se localizem mais perto das populações , obrigando a uma instalação geográfica dos mesmos , junto dos seus destinatários.

Para além disso , esta aproximação também abrange a parte psicológica e humana , na medida em que deve haver um maior contacto com a população ,ouvindo propostas e atendendo ás necessidades dos administrados.

 

  • Principio da participação dos interessados na gestão da Administração Pública – não intervenção dos cidadãos na vida da Administração Publica , sendo somente permitido a sua intervenção no âmbito da eleição dos respectivos órgãos.

Com isto , deve haver estruturas e esquemas que permitam a participação dos cidadãos no funcionamento da Administração , como por exemplo:

- do ponto de vista estrutural , a Administração deve ser organizada , de modo a que existam órgãos em que os particulares participem , para poderem ser consultados acerca das orientações ou decisões a adoptar.

Este principio consagra  vários tipos de organismos , tais como : Conselho Superior , Juntas etc. que têm como objectivo a institucionalização da participação dos cidadãos e das organizações representativas dos cidadãos , das empresas e associações.

- de um ponto de vista funcional , podemos notar que o que decorre deste principio é a necessidade de colaboração da Administração com os particulares , garantindo , deste modo, os vários direitos de participação dos particulares na actividade administrativa.

 

  • Principio da descentralização - recusa de qualquer politica que venha a ser executada num sentido centralizador.

O objectivo possível e desejável é que as atribuições não essenciais do Estado vão sendo transferidas , cada vez em maior numero para os municípios .

 

  • Principio da desconcentração – imposição à Administração de um mecanismo de desconcentração gradual, que se pode fazer através da desconcentração formal ou sob a forma de delegação de poderes.

 

Assim , podemos concluir que estes são os cinco princípios mais relevantes da organização administrativa.

Quem tem o dever de executar as directrizes constitucionais que emanam de tais serviços é o legislador ordinário.

 

No entanto , a nossa constituição , relativamente a esta matéria , não esta completa e o legislador ordinário não tem mostrado capacidade para dar continuidade a estes princípios constitucionais , tendo como acréscimo o facto de que os órgãos de fiscalização da inconstitucionalidade por omissão não têm mostrado preocupação com o assunto.

 

Limites

 

Relativamente aos dois últimos princípios (descentralização e desconcentração) , é importante dizer que os mesmos têm limites , que decorrem do artigo 267º , nº2 da CRP –“ (…) sem prejuízo da necessária eficácia e unidade de acção e dos poderes de direcção , superintendência e tutela dos órgãos competentes”.

 

Ninguém poderá invocar os princípios constitucionais da descentralização e da desconcentração contra quaisquer diplomas legais que adoptem soluções que tenham por objetivo a garantia da eficácia e unidade da acção administrativa e organizar/disciplinar os poderes de direcção , superintendência e tutela do Governo(ou de outros órgãos) .

 

Por último ,ninguém poderá invocar estes limites com o objectivo de esvaziar o conteúdo essencial dos respectivos princípios, uma vez que são fundamentais e , naturalmente , não poderão ser reduzidos de forma alguma.

 

 

Joana Melo , nº 28533

Turma B, subturma10

Ano lectivo 2016/2017

Direito Administrativo 1 – Prof. Joana Loureiro

Multiplicidade de tarefas da administração pública

Multiplicidade de tarefas da administração pública

Toda a administração pública envolve implementação de tarefas: a administração pública, visando a satisfação de necessidades coletivas, desenvolve uma multiplicidade de tarefas que, assumindo natureza instrumental, procura alcançar esse prepósito. Neste domínio integram-se, sem prejuízo do seu cruzamento ou cumulação, as seguintes principais tarefas da administração pública:

1 Recolha e tratamento de informações;

2 Previsão e antecipação de riscos;

3 Regulação ordenadora;

4 Execução de anteriores decisões;

5 Controlo da atuação;

Vou de seguida desenvolver cada uma das principais tarefas da administração pública.

1 Recolha e tratamento de informações

Quem tem a informações tem o poder efetivo de decisão. A multiplicação de fontes de informação fez aumentar o protagonismo das estruturas administrativas. Neste domínio, a administração pública tem uma vantagem face ao parlamento e aos tribunais, ampliada pela reserva constitucional de iniciativa legislativa da proposta de lei o orçamento de estado.

2 Previsão e antecipação de riscos

Nas últimas décadas, por efeito do progresso científico e tecnológico, assistiu-se a uma evolução da “sociedade técnica de massas” para uma “sociedade de risco”: o risco pressupõe técnica e a técnica gera risco. A administração pública mostra-se permeável às temáticas a prevenção e minimização dos riscos públicos, submetendo a regulação e a controlo diversos domínios de atividade. A moderna sociedade mostra uma patológica preocupação em áreas referentes à segurança, ao ambiente, urbanismo, e em geral, à sustentabilidade e a tudo aquilo que possa colocar em causa o bem-estar.

Neste sentido, a Administração pública tem de prever, antecipar e prevenir riscos, tanto das gerações presentes como ate das gerações futuras, informando, orientando e influenciando condutas dos cidadãos. A administração pública desenvolve uma atividade prospetiva, traçando cenários de previsão evolutiva da realidade, antecipa riscos e procura minora-los ou reduzir a zero o perigo da sua verificação, planeando e organizando meios de ação.

3 Regulação ordenadora

A administração desenvolve uma tarefa decisória que se traduz na regulação ordenadora e conformadora de tais situações (regulação primaria) ou de anteriores decisões jurídicas versando sobre tais situações (regulação secundaria).

- Resolve situações concretas através da aplicação de critérios normativos de decisão;

- Elabora normas;

- Prepara decisões do poder político, do poder legislativo e ate do próprio poder judicial;

 

4 Execução de anteriores decisões

A administração pública configura-se sempre como expressão executiva da vontade do legislador: administrar era executar a vontade geral, isto é, a lei proveniente do parlamento- tratava-se de um modelo ideal de administração serva da lei. Importa também atender que hoje:

- a administração publica pode executar diretamente da CRP, atos de direito internacional publico, direito da união europeia, do poder judicial e do próprio poder politico;

- a execução de tais atos confere à administração publica um papel ativo na determinação interpretativa do seu sentido, na concretização de uma normatividade principalista, de conceitos indeterminados, de clausulas gerais, alem da resolução de eventuais antinomias e integração de lacunas;

- a execução administrativa de anteriores decisões nem sempre se faz através da emanação de atos jurídicos, podendo também ser feita através de uma atividade material ou prestacional de bens e serviços, tendentes à satisfação concreta de necessidades coletivas;

5 Controlo da atuação

A administração pública desenvolve uma tarefa de controlo, fiscalizando, por iniciativa própria ou a pedido de terceiro, averiguando, ajuizando a validade, da conveniência ou da oportunidade das ações ou omissões, resultantes:

- da sua própria conduta;

- da conduta de privados que exercem funções publicas;

- da conduta de particulares, que sem exercerem funções públicas, desenvolvem atividades do setor privado ou do setor corporativo e social com relevância ou utilidade publica que, à luz do principio da proporcionalidade, justifique essa intervenção de controlo administrativo;

 

Ricardo João De Andrade da Cunha 

Nº de aluno: 26744

Direito Administrativo - episódios da vida pós-social

Com a abertura dos mercados a nível global, nos epílogos do século passado, simultaneamente causa e consequência do desenvolvimento tecnológico e dos processos produtivos, todos os níveis da vida das pessoas e dos Estados abriram portas a um novo paradigma. Desde deslocalização de empresas, fragmentação do processo produtivo, novas necessidades dos particulares, a necessidade de desburocratização e a exigência de eficácia, eficiência e celeridade inundaram o Estado-Administração como verdadeiros desafios carentes de resolução imediata. O Estado-prestador (cada vez mais prestador: muito longe parece já estar a primeira geração de direitos fundamentais, que entretanto, não só cresceram e assumiram novas e mais faces, com o reconhecimento dos direitos sociais e económicos dos cidadãos, como assumiram a vanguarda das preocupações estaduais, assumindo-se como primeiro e último objetivo do Estado), o Estado que assumiu como seu dever assegurar os direitos dos cidadãos, e afirmou estar, aí, a sua legitimação; aí, o fundamento dos seus poderes; aí, o seu único motivo de ser... Esse Estado sentiu a dificuldade de continuar a assegurar esses mesmo direitos, num mundo em contínuo crescimento: interconectado, interrelacionado, acordado para novos desejos, que num ápice passam a necessidades, e, como tal, a direitos. E então, o Estado metamorfoseou-se como pôde: de Estado Social, passou a Estado Pós-Social -- mas sempre "de Direito".

 A Administração prestadora conseguiu, assim, não renegar todo o seu crescimento, desde que nasceu no crepúsculo do Estado Liberal (nem mesmo esqueceu os seus traumas, como indica o Professor Vasco Pereira da Silva). Mas como fez isto? Vendo a rapidez com que o mundo se desenvolvia, o Estado quis devolver ao mundo parte das suas tarefas, mas sem nunca as tirar de debaixo de olho. E então, num mundo em que as relações económicas são ditadas pelo lucro, o Estado importa-se agora com garantir, prima facie, que as funções administrativas sejam lucrativas o bastante para aliciarem os particulares a fazerem parte delas e a prossegui-las. A nova grande tarefa da Administração é tornar o interesse público lucrativo, criar nos particulares o desejo de fazer parte da máquina prestadora, da márquina-providência, embora à margem da "máquina". Afirma-se, portanto, como Administração Infraestrutural. O ato administrativo unilateral perdeu-se, como alude o Professor Vasco Pereira da Silva, que se propôs procurá-lo, e o paradigma hoje é o do ato multilateral, o contrato. Recuperaremos esta ideia depois de explorarmos alguns tópicos a ela periféricos.

 

Em matéria de interrelacionamento e de interdependência, referimos já, noutra publicação (1), a evolução do Direito Administrativo no sentido da europeízação: afinal, a Europa, ainda não pronta para se reformar, assumiu ela própria, face aos cidadãos, algumas das promessas dos próprios Estados. Houve quem dissesse que o Direito Administrativo do novo século é Direito Europeu concretizado, por consagrar as suas grandes opções, em matérias variadas, respeitantes ao ambiente, ao consumo, ao desenvolvimento social das populações, para garantir que na Europa não há excluídos da globalização; e ainda para consagrar o direito à administração, que, ele próprio, surgiu como direito humano à escala universal. De facto, é através do Direito Administrativo que o Direito Europeu consegue fazer valer a sua, penetrando nos Estados e fazendo-se sentir nas vidas dos chamados cidadãos europeus. No entanto, este Direito Europeu rege-se pelo princípio da subsidariedade: fundamentalmente, a Europa só se imiscui, quando o Estado não parece conseguir levar a cabo a tarefa visada.

Fala-se ainda em Direito Administrativo Global. Afinal de contas, o cidadão nacional, depois cidadão europeu, retoma a qualidade de cidadão do mundo, mas não já na aceção com que Sócrates (o Antigo) o disse: as pessoas, cujos direitos já vimos serem hoje a principal preocupação dos Estados, são sujeitos de Direito Internacional e podem, inclusive, queixar-se de atuações (ou omissões) do seu Estado, perante tribunais internacionais. Podemos encontrar referência a este Direito Global em Sabino Cassese (2) e (3) e em publicação recente do Dr. Francisco de Abreu Duarte (4). Este Direito Global, em grande parte administrativo, é caracterizado como sendo constituído por relações horizontais entre sujeitos que são simultaneamente Administrador e Administrado (de facto, o regulador é, em regra, vinculado pelas regras que criou, por via das convenções internacionais: ou, melhor, o administrado transforma-se em contribuinte,em demandante e reivindicador - neste sentido, o Professor Alberto Romano), imperando uma confusão entre Direito Público e Privado, de difícil destrinça. A mesma tendência, como faz questão de notar o Dr. Francisco de Abreu Duarte, se verifica no Direito Administrativo Estadual, em que cada vez mais o administrado toma em mãos tarefas administrativas, em vista do interesse público. É válida, para aqui, a asserção de Sabino Cassese, de que o Direito Administrativo funciona em rede, quer dentro dos Estados, quer à escala global. Podemos, ainda, retirar das lições destes Autores, a ideia de que também o Direito Global é, de certa forma, subsidiário, pois existe e é necessário (segundo a Professora Maria Luísa Duarte, existe porque é necessário), porque o Estado não tem capacidade ("States are not able (...)") para solucionar questões que o ultrapassam em importância, recursos e jurisdição. O Professor Fausto de Quadros reconduz, em última instância, esta necessidade para o Ius Cogens e, em particular, para a garantia dos direitos fundamentais da Pessoa Humana, segundo referencia o Dr. Francisco de Abreu Duarte.

 

No âmbito estadual, como dizíamos, várias tarefas administrativas foram sendo assumidas pelos particulares, falando alguns autores numa "fuga para o Direito Privado" (esse o título da tese de doutoramento da Professora Maria João Estorninho). Encontramos várias concretizações da ideia, que referiremos agora. As entidades públicas empresariais, embora sejam verdadeiras pessoas coletivas públicas de Direito Público, criadas pelo Estado para prosseguir funções do Estado, integram o setor empresarial e, nesse sentido, regem-se pelo Direito Privado (e, nomeadamente, pelas regras da concorrência) no âmbito das suas relações comerciais. Para além disso, embora as suas atribuições e as competências dos respetivos orgãos encontrem legitimação na lei, a teoria dos poderes implícitos permite que nem toda a atividade destas pessoas coletivas esteja prevista na lei, com base em duas ideias estruturantes: (a) quem pode o mais, pode o menos; (b) a quem é conferida uma determinada atribuição, é também possível praticar as atividades que resultem na sua concretização. Há também pessoas coletivas de Direito Privado que prosseguem o interesse público, como é o caso de algumas sociedades comerciais, associações e fundações: é a Administração Pública sob forma privada. É ainda conferida a prossecução de determinadas funções administrativas a entes privados, funções essas que não perdem a sua natureza pública, embora sob gestão privada: neste sentido, o Professor Vasco Pereira da Silva afirmou, numa das suas aulas, que administrar se transformou numa tarefa de gestão. À transferência de atribuições para pessoas coletivas privadas de fins não lucrativos dá-se o nome de delegação de atribuições (embora não se possa falar, summo rigore, em delegação de poderes), enquanto à transmissão de atribuições para pessoas coletivas privadas de fins lucrativos se dá o nome de concessão: em ambos os casos, a autorização do concessionário/delegado é sempre necessária, quer seja mediante a aceitação de um ato administrativo unilateral, quer seja por via de um contrato administrativo (modalidade que, infelizmente, não poderemos desenvolver para já).

 

Não deveria haver, aqui, qualquer incompatibilidade de Direitos. Quanto muito, concurso: certas entidades seriam regidas pelo Direito Público, nuns casos, e pelo Direito Privado, noutros.Tudo isso viria regulado pelas respetivas leis orgânicas, estatutos e atos ou contratos constituintes. Não deveria, portanto, haver, nem confusão, nem mestiçagem ou miscigenação (5). Não se deveria sequer falar em Direito Administrativo Privado, como Wolff faz. Porquê? Porque tudo isso gera um clima de incerteza que a cooperação entre Administração e administrados não criaria necessariamente. De facto, se já passou o tempo da Administração cujo Direito serve para a blindar a ofensas e para a tornar quase que inimputável (Administração privilegiada, autoritária), não é hoje, através da aplicação do Direito Privado, que isso se pode retomar. No entanto, apercebendo-nos de que não é tão linear quanto isto e partilhando das hesitações (e ceticismo) da Professora Maria João Estorninho, terminamos este pequeno exercício de reflexão com um olhar de desconfiança sob esta nova realidade, a que Prosper Weil se refere como um "espetáculo desorientante". Nesse sentido, concluimos com algumas das ambiguidades e riscos desta forma de organização que a Professora Maria João Estorninho refere na sua tese:

  • Objetivos velados e subreptícios, de tentar ultrapassar as vinculações jurídico-públicas a que a Administração de outro modo estaria sujeita (Achterberg considera que se consegue, assim evitar o “controlo democrático do ente-mãe”): passa-se, assim, de uma fuga inocente a uma fuga “consciente e perversa” para o Direito Privado, que pode deixar os indivíduos desprotegidos contra Administração;
  • Regime jurídico de natureza mista, de direito privado e de direito público;
  • A proclamada autonomia destas entidades acaba por ser algo ilusória: “ou seja, nem há verdadeira autonomia, que levaria a que funcionassem os mecanismos de controlo normais do Direito Privado, em especial do Direito Comercial, nem, por outro lado, se reconhece que estas entidades são afinal ainda entidades públicas, sujeitas aos controlos tradicionais jurídico-públicos”.
  • Para Maria João Estorninho, a Administração Pública atinge assim um retrocesso: “no Estado Pós-Social a Administração volta a ter uma <<cara má>> e uma <<cara boa>>, à semelhança do que acontecia no Estado Absoluto. Só que, ao contrário do que sucedia no período da Monarquia Absoluta, onde apenas no âmbito jurídico-privado havia a sujeição da Administração ao Direito, no Estado Pós-Social verifica-se precisamente o inverso e a <<cara má>>, a <<faceta perversa>> desta Administração Pública <<esquizofrénica>>, revela-se quando ela opta por atuar segundo o Direito Privado e foge às suas vinculações jurídico-públicas”;
  • Promiscuidade entre Direito Público e Privado à Confusão prática entre as respetivas formas de organização, de atuação e de responsabilidade;
  • Problema da redefinição das fronteiras orgânicas da Administração Pública.

 

Beatriz Vitorino

Aluna nr. 28191

Análise de Jurisprudência - Administração Indireta e Princípios Administrativos

            O Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), de 27/05/2009, relativo ao processo nº 0182/09, releva para o estudo dos poderes de tutela e superintendência governamentais relativamente à Administração Indireta do Estado, neste caso, relativamente a uma Entidade Pública Empresarial (E.P.E.). Trata-se de um recurso, interposto por um médico gastroenterologista (A), em relação a um despacho da Ministra da Saúde, de 16/09/2000, que negava provimento ao recurso hierárquico interposto de um despacho do Inspetor-Geral de Saúde, que determinava a reposição, pelo recorrente, da quantia de 7.998.509.00 Escudos, no âmbito de um “Acordo de Prestação Funcional Extraordinário no âmbito da Gastroenterologia”. A fundamentação para o recurso, como aponta a Magistrada do Ministério Público, passa pela alegação de três vícios, a saber: vício de incompetência, vício de falta de fundamentação e vício de violação de lei.

            Antes de entrarmos na análise do Acórdão propriamente dito, importa clarificar alguns aspetos. Para começar, o que é a Administração Indireta do Estado? Como temos vindo a estudar ao longo do semestre, a Administração Pública (AP) têm como fim último a satisfação do interesse público. Sabemos também, que o Estado não é a única pessoa que, atualmente, prossegue o interesse público. São precisamente estas pessoas, que não o Estado, mas por este criadas, que também prosseguem as atribuições do Estado e o coadjuvam na realização destas. Nas palavras de Freitas do Amaral, de um ponto de vista subjetivo, a Administração Indireta do Estado define-se como “o conjunto das entidades públicas que desenvolvem, com personalidade jurídica própria e autonomia administrativa, ou administrativa e financeira, uma atividade administrativa destinada à realização de fins do Estado”. Segundo o mesmo autor, esta seria, do ponto de vista material, definida como “uma atividade administrativa do Estado, realizada, para a prossecução dos fins deste, por entidades públicas dotadas de personalidade jurídica própria e de autonomia administrativa ou financeira”.

            No caso que encontramos no já referido Acórdão do STA, de 27/05/2009, relativo ao processo nº 0182/09, está em causa uma E.P.E., mais concretamente, um Hospital sob a forma de E.P.E. Segundo Freitas do Amaral e João Caupers, as E.P.E.’s fazem parte da Administração Estadual Indireta. As E.P.E.’s são pessoas coletivas públicas, ou seja com personalidade jurídica pública, sob a forma de empresas. Durante o litígio aqui em causa, sobre as E.P.E.’s e, em geral, sobre o setor empresarial do Estado, vigorava o Decreto-Lei (DL) nº 558/99, de 17 de Dezembro.

                De seguida, importa também analisar a posição da Ministra da Saúde e do Inspetor-Geral de Saúde, em relação ao Hospital E.P.E. aqui em causa. Como sabemos, os Ministros integram o Governo (cfr. artigo 183º da Constituição da República Portuguesa [CRP]). O Governo é um órgão do Estado (cfr. artigo 182º CRP), pelo que se insere na Administração Direta e Central do Estado, uma vez que exerce as suas competências em toda a extensão do território nacional e se insere dentro do próprio Estado, enquanto pessoa coletiva. A Ministra da Saúde dirige o Ministério da Saúde (cfr. artigo 201º/2, alínea a), CRP).

            No que diz respeito ao Inspetor-Geral, este é um órgão da Inspeção-Geral dos Serviços e Saúde (IGSS), como postula o artigo 4º/1 do DL nº 312/87, de 18 de Agosto, que se encontrava vigente na altura do pleito. O mesmo diploma estabelece, no artigo 1º/1, que a IGSS é um órgão do Ministério da Saúde. Assim sendo, podemos afirmar que a IGSS também faz parte da Administração Direta e Central do Estado. Estabelece-se, assim, uma relação entre a Ministra da Saúde e o Inspetor-Geral, sendo esta relação uma relação de hierarquia, uma vez que ambos se encontram submetidos àquela. Dentro desta relação de hierarquia, há que mencionar a existência de uma série de poderes, entre os quais destacamos o poder de direção, que consiste na possibilidade de o órgão superior, a Ministra da Saúde, dar ordens ao órgão inferior, o Inspetor-Geral.

            Entrando agora no que concerne ao Acórdão propriamente dito, o STA dá como matéria de facto que o recorrente, durante determinado período de tempo, e dentro do horário de trabalho no Hospital E.P.E., efetuou exames enquanto profissional liberal, utilizando pessoal do Hospital para o coadjuvar, sendo remunerado por ambas as atividades, públicas e privadas.

            Relativamente ao vício de incompetência, que A alega, podemos formular várias observações. Primeiro, essa sanção foi-lhe aplicada pelo Inspetor-Geral do IGSS. O Acórdão começa por referir o artigo 2º/1 do DL nº 19/88, de 21 de Janeiro, que determina que “Os hospitais são pessoas coletivas de direito público, dotadas de autonomia administrativa e financeira, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte”. O artigo seguinte refere, justamente, a superintendência e a tutela que o Ministro da Saúde exerce sobre os hospitais, sendo destacado no Acórdão agora em análise o número 3 do artigo 3º que atribui ao Ministro da Saúde a competência para “ordenar inspeções e inquéritos ao funcionamento dos hospitais”. Para além desta disposição, há a referir que a existência de tutela e superintendência na Administração Indireta do Estado é uma exigência constitucional, ao abrigo do artigo 199º, alínea d), CRP. A superintendência e a tutela traduzem-se, nestes casos, na possibilidade de o Governo poder emitir diretivas, recomendações ou orientações às pessoas coletivas que integram a Administração Indireta. Não existe poder de ordenação, uma vez que se tratam de pessoas coletivas diferentes, existindo, no entanto, um controlo genérico das atividades destas pessoas coletivas públicas por parte do Governo.

            Podemos retirar do mencionado artigo 3º/3 que, se o Ministro da Saúde ordena inspeções e inquéritos ao funcionamento dos hospitais, então, caso sejam detetadas irregularidades, também poderá desencadear os processos disciplinares necessários, cabendo-lhe, de igual modo, impor a sanção final. Para este efeito, intervém a IGSS, um órgão fiscalizador e disciplinar que exerce a sua ação “em todos os serviços e estabelecimentos dependentes do Ministério da Saúde ou sujeitos à sua tutela” (cfr. artigo 1º/2 DL nº 312/87, de 18 de Agosto). Nos termos da alínea e) do artigo 6º/2 do mesmo diploma, a competência para aplicar a sanção em causa pertence ao Inspetor-Geral. Tendo sido dado como provado que isso foi o que verdadeiramente aconteceu, pensamos que o STA agiu corretamente ao considerar improcedente a arguição feita por A, relativamente a um potencial vício de incompetência do ato.

            O recorrente alega também um vício de falta de fundamentação do ato. Esta matéria será estudada em maior detalhe no segundo semestre. Por agora compete apenas referir que, de acordo com o artigo 124º do Código de Procedimento Administrativo (CPA) de 1991 (atual artigo 152º CPA), há atos que devem ser obrigatoriamente acompanhados de fundamentação, entre os quais os que decidam de reclamação ou recurso, que é o caso que verificamos no presente Acórdão. Os requisitos desta fundamentação encontram-se presentes no artigo seguinte (artigo 125º CPA 1991 ou artigo 153º CPA 2015, sendo que a redação dos artigos é igual). Segundo estas disposições, “A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem, neste caso, parte integrante do respetivo ato”. Não tendo ainda estudado a matéria referente a esta objeção, partiremos do pressuposto que o STA teve razão ao considerar que a fundamentação do ato cumpria com os requisitos do artigo 125º do CPA (que na altura se encontrava em vigor).

             Em última instância, A alega que a decisão padece de ilegalidade, nomeadamente erro nos pressupostos de facto e de direito e violação dos princípios de desburocratização, eficiência e boa-fé. A sanção é originalmente aplicada porque A, durante o período de trabalho como funcionário público, exercia as mesmas funções enquanto privado, ao abrigo do mencionado Acordo com o Hospital E.P.E., pelo que estava a ser remunerado duas vezes pelo trabalho exclusivamente desempenhado durante o seu período enquanto trabalhador público. Assim sendo, e apesar de uma cláusula do Acordo permitir, excecionalmente, que os exames fossem realizados durante as horas normais de trabalho, podemos concluir que A agiu de má-fé, nos termos do artigo 6º-A do CPA 1991 (atual artigo 10º CPA) e 266º/2 CRP, pelo que o seu comportamento é censurável. Já o mesmo não pode ser dito relativamente à AP. Esta apenas exigiu a reposição dos pagamentos feitos em excesso a A, podendo fazer-se apelo ao disposto no artigo 473º do Código Civil (CC), relativamente ao enriquecimento sem causa, uma vez que a A recebia duas vezes por o seu trabalho já remunerado enquanto profissional público. Também não vemos, à semelhança do STA, razão para a invocação de uma violação do princípio da desburocratização e eficácia, previsto no artigo 10º CPA 1991 (atual artigo 5º/2 CPA). Por estes motivos, é também improcedente a pretensão de A de fazer valer um vício de ilegalidade.

            A propósito deste último parágrafo, há que desenvolver um pouco sobre o exato conteúdo de ambos os princípios administrativos aqui referidos, o princípio da boa-fé e o princípio da desburocratização e eficácia. Começando pelo princípio da boa-fé, este encontra, conforme mencionado anteriormente, consagração constitucional, no artigo 266º/2 CRP, e consagração legal, no artigo 10º CPA. Ele compreende dois subprincípios, o princípio da materialidade subjacente e o princípio da tutela da confiança. O primeiro exprime, segundo Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos, “a ideia de que o direito procura a obtenção de resultados efetivos, não se satisfazendo com comportamentos que, embora formalmente correspondam a tais objetivos, falhem em atingi-los substancialmente.” Para esta ideia nos remete o atual artigo 10º/2 CPA, ao referir expressamente o “objetivo a alcançar com a atuação empreendida”. Embora, como parâmetro da atuação da AP, acabe por ser abrangido pelo princípio da legalidade, ele ganha particular relevância enquanto parâmetro das condutas dos particulares nas suas relações para com a AP. Relativamente ao segundo subprincípio, o da tutela da confiança, este pressupõe o preenchimento de uma série de pressupostos, a saber: uma atuação de um sujeito de direito; uma situação de confiança justificada; um investimento de confiança; um nexo de causalidade e a frustração da confiança. Este princípio é de aplicação mais fácil às entidades que compõem a AP, uma vez que a pode forçar à não adoção de um comportamento que frustre a confiança de um ou mais particulares. No caso a que se refere o Acórdão existe, por parte de A, uma manifesta violação do princípio da materialidade subjacente, uma vez que, por um lado, A podia realizar exames enquanto profissional público e enquanto profissional liberal no Hospital E.P.E., no entanto, não poderia nunca exercer simultaneamente esses dois papéis, pelo que age de má-fé.           

            Relativamente ao princípio da desburocratização e eficiência, ele encontra-se atualmente previsto, como referimos anteriormente, no artigo 5º/2 CPA (artigo 10º CPA 1991). Este princípio, como referem Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos, atua em duas vertentes, sobre a estruturação administrativa e sobre o procedimento administrativo. Em relação ao primeiro, “contra-indica estruturas desnecessariamente complexas, duplicações de atribuições ou competências, distanciamento excessivo entre as entidades administrativas e os particulares e entre os órgãos de instrução e de decisão e os seus destinatários”. Em relação ao segundo plano, obsta a procedimentos administrativos longos, lentos e formalizados, em demasia, e, por estes motivos, não apropriados para a adoção de decisões eficientes. No caso do Acórdão, não nos parece haver motivo para a invocação que A faz a este princípio, uma vez que, como afirma o STA, a exigência de reposição do que foi excessivamente pago “não se traduz em qualquer procedimento burocrático”.

            Concluímos, então, esta análise ao Acórdão do STA, de 27/05/2009, relativo ao processo nº 0182/09 afirmando que o STA agiu bem ao decidir pela negação de provimento ao recurso, uma vez que a atuação de A se traduz numa violação do princípio da boa-fé, devendo por isso restituir aquilo que a mais ganhou durante o período em que vigorou o Acordo entre si e o Hospital E.P.E., por via de enriquecimento sem causa, conforme o artigo 473º CC.

 

Francisco Azevedo, nº 28198

Vai uma bola de Berlim? Não na administração pública, dizem especialistas

Noticia de Joana Gorjão Henriques  (13 de novembro de 2016, Público)

“Diretor do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável e bastonária da Ordem dos Nutricionistas defendem que se devia limitar a venda de comida e bebida não saudável nas máquinas que estão nos serviços da administração pública.

(…)

Em junho, o Ministério da Saúde publicou um despacho a determinar a limitação de produtos prejudiciais à saúde, mas apenas nas máquinas de venda automática disponíveis nas suas instituições — agora a Madeira estendeu-a. Donuts, bolas de Berlim, Coca-Cola ou álcool, pão com chouriço, rissóis ou croissant com chocolate são alguns desses produtos proibidos.

“Um dos objetivos deste modelo foi o serviço público de saúde ter uma oferta alimentar que não contrariasse as orientações da Direcção-Geral da Saúde. Sempre achei que o Serviço Nacional de Saúde não deveria ser o único local onde estas orientações fariam sentido. Por exemplo, nas universidades, os locais onde se faz educação e se estão a formar pessoas, não se deveriam contradizer as orientações”, defende Pedro Graça. 

O despacho de junho do Ministério da Saúde estabelece um prazo de três meses (que terminou em setembro) para as instituições de saúde aplicarem as regras em novos contratos para as máquinas de venda, e seis meses (até dezembro) no caso de terem que fazer a revisão desses contratos — desde que isso não implicasse indemnização ou penalização, explica Pedro Graça. Por isso, ainda é cedo para fazer um balanço. Porém, Pedro Graça não recebeu informação de que a medida esteja a ser mal recebida, nem que alguma empresa tenha retirado a sua máquina de venda de alimentos do serviço de saúde por causa dessas restrições. Tem até tido feedback de que muitas empresas se adaptaram e oferecem agora alternativas saudáveis.

Há dados que podem dar uma pequena ideia. Resultados das vendas e consumos nas máquinas de venda automática no Hospital Dona Estefânia, em Lisboa — onde está a ser desenvolvida a experiência-piloto de implementação da diretiva —, mostram que houve variações nas vendas com os novos produtos “saudáveis” e desaparecimento de outros como refrigerantes e batatas fritas. Em julho deste ano, houve uma subida de 3% das vendas em relação ao mês homólogo de 2015 e, em agosto, essa subida foi de 24%; mas em setembro e outubro desceram 7%.

Também a bastonária da Ordem dos Nutricionistas, Alexandra Bento, tem recebido feedback positivo da implementação desta diretiva — através de colegas, de profissionais de saúde e das empresas que atuam no sector. “Mas esta perceção não é uma certeza”, comenta. “Por isso, em 2017, vamos fazer um levantamento do cumprimento [da diretiva], apesar de não termos essa obrigação.” Também a ordem defende a aplicação destas diretivas a toda a administração pública.

Falta generalizar esta medida no continente, a toda a administração pública, e para isso seria necessário uma norma, não necessariamente com legislação, acrescenta Pedro Graça. Que conclui: “Não é só o Ministério da Saúde que tem que fazer pela saúde, mas todas as áreas governamentais que têm que ter a saúde nas suas políticas e lutar pela saúde dos portugueses.” (…)”

Há, neste artigo, diversos conceitos que carecem de explicação.

Primeiramente, pelo Decreto-Lei n.º 124/2011 de 29 de dezembro, o Ministério da Saúde é um departamento governamental (sendo assim parte da Administração Direta do Estado, concretamente, da Administração Central). Nos termos do decreto regulamentar nº14/ 2012 de 26 de janeiro, A Direção-Geral da Saúde é um serviço central do Ministério da Saúde, integrado na administração direta do Estado, dotado de autonomia administrativa.

O Despacho n.º 6401/2016 de 16 de maio, do Secretário de Estado Adjunto e da Saúde, determina o desenvolvimento, no âmbito do Plano Nacional de Saúde, de programas de saúde prioritários, nomeadamente, na Promoção da Alimentação Saudável e é neste âmbito que se insere o Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável e, em particular, o respetivo diretor (nomeado nos termos do Despacho nº 7433/2016 de 25 de maio).

Pela lei orgânica do Ministério da saúde (Decreto-Lei n.º 124/2011de 29 de dezembro), este tem nas suas atribuições “Assegurar as ações necessárias à formulação, execução, acompanhamento e avaliação da política nacional de saúde”, podendo todo o tema desta notícia ser integrado nesta atribuição (o Ministério da Saúde publicou um despacho a determinar a limitação de produtos prejudiciais à saúde (..) nas máquinas de venda automática disponíveis nas suas instituições).

A ordem dos nutricionistas é também muitas vezes referida na noticia pelo que importa esclarecer a mesma. Pela Lei n.º 126/2015 de 3 de setembro, a ordem é uma a “associação pública profissional representativa daqueles que, em conformidade com o presente estatuto e as demais disposições legais aplicáveis, exercem a profissão de nutricionista” que tem autonomia administrativa, patrimonial e financeira. Quando a bastonária da referida ordem diz por isso, em 2017, vamos fazer um levantamento do cumprimento [da diretiva], apesar de não termos essa obrigação.”, de facto, não é parte das suas atribuições, pelo que não deve ser um objetivo prosseguido pela ordem.

O ultimo paragrafo refere que não é apenas o Ministério da Saúde que “tem de fazer pela saúde”, contudo pela sua lei orgânica este “é o departamento governamental que tem por missão definir e conduzir a política nacional de saúde, garantindo uma aplicação e utilização sustentáveis dos recursos e a avaliação dos seus resultados”, pelo que “fazer pela saúde” é, precisamente, a missão do MS através de serviços integrados na administração direta do Estado, de organismos integrados na administração indireta do Estado, de órgãos consultivos, de outras estruturas e de entidades integradas no sector empresarial do Estado.

A titulo de conclusão, vem consagrado no artigo 64º/1 da Constituição da República Portuguesa, “todos têm direito à proteção da saúde e o dever de a defender e promover”. Acrescenta ainda, o mesmo artigo no seu nº3, as incumbências prioritárias do Estado na promoção do direito á saúde, sendo o âmbito desta noticia relacionável com as alíneas d. e e, ambas incluídas na já mencionada missão do Ministério da saúde.

Bibliografia:

  • https://www.publico.pt/sociedade/noticia/vai-uma-bola-de-berlim-nao-na-administracao-publica-defendem-especialistas--1750574?page=-1;
  • MARCELO REBELO DE SOUSA / ANDRÉ SALGADO DE MATOS, «Direito Administrativo Geral», D. Quixote, Lisboa - tomo I, «Introdução e Princípios Fundamentais»;
  • DIOGO FREITAS DO AMARAL, «Curso de Direito Administrativo», volume I, 4ª edição, Almedina, Coimbra, 2015.

 

Joana Luís Gonçalves

Nº 28204

Competência e delegação de poderes - Análise de um acórdão do STA

            O acórdão que propomos analisar é o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 14/12/2011, processo 0544/10. Este acórdão evidencia questões de grande relevância no estudo do Direito Administrativo, particularmente matéria relativa a competência dos órgãos estaduais e à delegação de poderes.

            Importa em primeiro lugar apresentar a situação em causa para posteriormente comentar e avaliar a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA). O litígio em questão resulta da instauração de um processo disciplinar a um Professor profissionalizado do 1º Ciclo do Ensino Básico, ao qual foi aplicada a pena de demissão pelo Secretário de Estado Adjunto e da Educação, por se ter ausentado do serviço sem justificar as faltas. O autor imputou ao ato impugnado o vício de incompetência do seu autor, por entender que a Ministra da Educação não podia delegar a competência para aplicar penas expulsivas no Secretário de Estado Adjunto e da Educação, e por considerar que o despacho de delegação não cumpriu com os requisitos do art. 37º/1 do Código de Procedimento Administrativo (CPA), que encontram cabimento no art. 47º/1 do CPA atual, uma vez que não especificou os poderes que são delegados nem os atos que o delegado pode praticar.

            O tribunal da primeira instância determinou a validade do ato, tendo o autor interposto recurso para o Tribunal Central Administrativo Norte (TCA Norte), que veio a conceder provimento ao recurso, revogar a decisão do tribunal de primeira instância e a anular o ato impugnado, alegando que o ato era de competência exclusiva da Ministra da Educação e que o Secretário de Estado Adjunto e da Educação não tinha competência para aplicar penas disciplinares.

            O Ministério da Educação vem interpor recurso desta decisão e o STA concede provimento a este recurso. Para averiguar a sensatez desta decisão vamos criticar os principais argumentos utilizados por ambas as partes para justificar a sua posição e os critérios que orientaram a decisão do TCA Norte e do STA.

 

Juízo do TCA Norte

            A decisão do tribunal de segunda instância foi favorável ao autor, ao considerar improcedente a ação administrativa do tribunal de primeira instância e ao revogá-la. O tribunal fundamentou a sua resolução invocando um vício de incompetência do autor do ato.

            O vício de incompetência do ato resultava do facto de a competência conferida à Ministra da Saúde no art. 116º/3 do Estatuto da Carreira Docente (ECD) consistir numa competência exclusiva da Ministra da Saúde e do facto de o Secretário de Estado Adjunto não ter competência própria nem a lei habilitante lhe conferir competência para aplicar penas disciplinares. Consequentemente, o ato foi executado por um órgão incompetente.

 

Juízo do STA, baseado nas alegações do Ministério da Educação       

            Da perspetiva do Ministério da Educação, o órgão autor do ato impugnado tinha competência, logo o acórdão do TCA Norte não se deveria manter. As principais alegações são a que afirma que a competência atribuída no art. 116º/3 ECD era garantidamente competência própria e exclusiva da Ministra da Saúde, a afirmação de que mesmo sendo exclusiva a competência da Ministra da Educação tal não significada que se tratasse de um poder indelegável, e a prova de que a Ministra da Educação delegou evidentemente competências suas e não da IGE, como parece entender o acórdão recorrido. Passamos a desenvolver estes três fundamentos.

            Em primeiro lugar, o conceito de competência exclusiva consiste num poder conferido a um órgão, com exclusão dos demais órgãos da hierarquia, sendo em regra atribuído ao órgão mais elevado da hierarquia da pessoa coletiva. Uma vez que o Ministro da Educação é o órgão mais elevado da hierarquia e uma vez que o art. 116º/3 ECD lhe confere expressamente a competência para aplicar penas expulsivas, a Ministra da Educação tem competência própria e exclusiva nesta matéria.

            Seguidamente se afirma que a exclusividade da competência não determina se esta pode ou não ser delegada, uma vez que, de acordo com o entendimento do Prof. Freitas do Amaral, a delegação de poderes não implica a transferência da titularidade da competência, que é inalienável e irrenunciável (art. 36º/1 do atual CPA), mas do seu exercício, podendo efetuar-se a delegação de poderes (art. 35º/1 do antigo CPA e 36º/2 e 44º/1 do atual CPA). Neste caso, afirma-se que o ato foi praticado ao abrigo de uma delegação de poderes permitida pela Lei orgânica do XVII Governo Constitucional (art. 9º do DL n.º 79/2005). Por estes motivos, a Ministra da Saúde podia delegar a sua competência no Secretário de Estado Adjunto.

            Por último, o acórdão recorrido considerou que a delegação era insuficiente porque “não era da atribuição da Inspeção Geral de Educação (IGE) a aplicação de penas disciplinares”, parecendo aqui alegar que a lei habilitante é a lei orgânica da IGE, o que não faz qualquer sentido, uma vez que a Ministra da Educação só pode delegar as suas próprias competências, entre as quais a do art. 9º/1 da Lei n.º 79/2005. Além do mais, o facto de uma delegação ser efetuada de um modo amplo implica apenas que foi delegada uma quantidade grande de poderes, e o facto de ser genérica somente significa que foi concedida a permissão para praticar vários atos, o que não afeta a validade da delegação. Uma vez que foram enumerados explicitamente os poderes delegados, não se encontram preenchidos os requisitos para a invalidade do ato (art. 47º do atual CPA).

 

Ponderação e veredito pessoal

            Tendo em conta os argumentos que foram anteriormente expostos, parece-nos ser mais razoável a decisão do STA. Passamos a salientar as razões.

            O despacho de delegação de poderes ao Secretário de Estado Adjunto e da Educação continha o seguinte:

«Ao abrigo do artigo 9º do Decreto-Lei nº79/2005, de 15 de abril e dos artigos 35º e 36º do Código de Procedimento Administrativo, delego no Secretário de Estado Adjunto e da Educação, Prof., com a faculdade de delegação:
1.1. A competência para decidir acerca dos assuntos relativos aos serviços e organismos:
a) (…)
b) Inspeção-Geral da Educação.
(…)» 

            Consideramos que a aplicação de sanções disciplinares é, muito provavelmente, um assunto que diz respeito às atribuições da IGE. Uma vez que o Decreto Regulamentar n.º 81-B/2007 de 31 de julho, alterado pelo Decreto Regulamentar n.º 16/2009 de 2 de setembro, não se encontra disponível online, teremos que nos orientar com base no Decreto Regulamentar n.º 15/2012 de 27 de janeiro, posterior à resolução do STA. Este último decreto regula o funcionamento da Inspeção-Geral da Educação e Ciência, que resulta da fusão da anterior Inspeção-Geral da Educação e Inspeção-Geral do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

             No art. 2º/2 f) do decreto postula-se que a Inspeção-Geral da Educação e da Ciência prossegue a atribuição de: “assegurar a ação disciplinar e os procedimentos de contra -ordenação, previstos na lei, nomeadamente, através da respetiva instrução”. Este preceito garante que a aplicação de sanções é do interesse da sua atividade. Uma vez que a Ministra da Educação delega ao Secretário de Estado Adjunto e da Educação o poder de decidir de assuntos relativos à Inspeção Geral da Educação, parece lógico que este possa aplicar uma sanção a um Professor de Ensino Básico.

             Em suma, a aplicação da pena de demissão ao autor por parte do Secretário de Estado Adjunto e da Educação é válida, uma vez que este órgão tinha poderes delegados formalmente para a prática deste ato pela Ministra da Educação, por força do art. 9º do DL n.º 79/2005. Por sua vez, a Ministra da Educação tinha competência para praticar o ato que delegou (art. 116/3 ECD).

 

Maria Inês Gonçalves

n.º 28192

 

Natureza Jurídica da Federação Portuguesa de Futebol (FPF)

Natureza jurídica da Federação Portuguesa de Futebol (FPF)

 

  1. Introdução

O presente texto tem por objetivo explicar qual a natureza jurídica da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e perceber onde se encaixa no Direito Português, isto é, se tem relevância para o Direito Administrativo, ou se apenas é relevante para o Direito Privado. A FPF é uma pessoa coletiva à qual o Direito atribui a qualidade de pessoa jurídica, ou seja, o Direito atribui-lhe a capacidade de ser titular de direitos e obrigações. Para entender melhor a qualificação dada à FPF é necessário recorrer à numerosa legislação que lhe é aplicável que passa pela legislação aplicável às federações desportivas, pelas leis de bases do desporto e, principalmente, pelos seus próprios Estatutos.

 

  1. Federação Portuguesa de Futebol enquanto pessoa coletiva

Enquanto pessoa coletiva, a FPF prossegue determinados fins, isto é, tem uma determinada missão a cumprir e essa missão vem especificada, nos seus estatutos, como o “objeto” da FPF. Assim, nos termos do artigo 2.º, nº1 dos Estatutos da FPF, é o seu principal objeto promover, regulamentar e dirigir, a nível nacional, o ensino e a prática do futebol, em todas as suas variantes e competições. Já o nº2 prevê as atribuições da FPF para a boa prossecução do seu objeto. O nº3 prevê ainda as suas atribuições num âmbito de cooperação com outras entidades internacionais na área desportiva como a FIFA e a UEFA.

Como qualquer pessoa coletiva, a FPF é composta por vários órgãos, os quais têm a seu cargo as competências determinadas pelos estatutos para promover o bom funcionamento da entidade e para prosseguir de forma organizada, eficiente e eficaz a sua missão no âmbito estrutural e desportivo.

A FPF é uma federação desportiva e, por conseguinte, está sujeita ao regime jurídico das federações desportivas (RJFD), aprovado pelo Decreto-Lei 248-B/2008, de 31 de dezembro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei 93/2014, de 23 de junho. Este decreto-lei tem por objeto estabelecer o regime jurídico das federações desportivas e as condições de atribuição do estatuto de utilidade pública desportiva (artigo 1.º).

Segundo este decreto-lei, as federações desportivas são pessoas coletivas constituídas sob a forma de associação sem fins lucrativos que podem englobar clubes, sociedades desportivas, associações de âmbito territorial, ligas profissionais, praticantes, técnicos, juízes, árbitros e demais entidades que promovam, pratiquem ou contribuam para o desenvolvimento da respetiva modalidade (artigo 2.º).

O regime aplicável às federações desportivas é o citado decreto-lei bem como o regime jurídico das associações de direito privado, presentes no Código Civil.

 

  1. A Federação Portuguesa de Futebol enquanto associação de direito privado

Os Estatutos da Federação Portuguesa de Futebol (FPF), no seu artigo 1.º relativo à denominação, caracterização jurídica da FPF, qualifica-a como sendo uma pessoa coletiva sem fins lucrativos, de utilidade pública, constituída sob a forma de associação de direito privado.

O capítulo II (artigos 10.º e seguintes) do DL 248-B/2008 republicado estabelece o estatuto de utilidade pública desportiva e, esse estatuto, nos termos do artigo 10.º, confere a competência para o exercício, em exclusivo, por modalidade ou conjunto de modalidades, de poderes regulamentares, disciplinares e outros de natureza pública, bem como a titularidade de direitos e deveres especialmente previstos na lei. Para uma federação desportiva gozar do estatuto de utilidade pública desportiva é necessário, segundo o artigo 16.º, proceder a um requerimento junto do membro do Governo responsável pela área do desporto. No caso da FPF, o seu estatuto de utilidade pública desportiva vem aprovado pelo Despacho nº 5331/2013 (tal como é referido pelo nº7 do artigo 1.º dos Estatutos).

O facto de a FPF ser uma pessoa coletiva sem fins lucrativos evidencia claramente o seu afastamento de qualquer possível comparação com uma entidade empresarial, quer pública, quer privada.

Os estatutos da FPF referem que esta é uma pessoa coletiva constituída sob a forma de associação de direito privado, pelo que está sujeita às disposições gerais das pessoas coletivas presentes no Código Civil (artigo 157.º e seguintes). O artigo 157.º do Código Civil refere que o regime é aplicável às associações que não tenham por fim o lucro económico dos associados. A sua personalidade jurídica é reconhecida pelo artigo 158.º, assim como a sua capacidade de ser titular de direitos e obrigações necessárias à prossecução dos seus fins é reconhecida pelo artigo 160.º. No entanto, o regime que mais importa para a FPF é o regime das Associações presente na secção II, ou seja, nos artigos 167.º e seguintes do Código Civil, que estabelecem todas as normas relativas à sua constituição, aos seus estatutos, à sua forma e comunicação, aos titulares dos seus órgãos, ao funcionamento geral dos seus órgãos e à sua própria extinção.

 

Voltando ao DL 248-B/2008 republicado, convém referir que este regula a estrutura orgânica das federações desportivas nos artigos 32.º e seguintes, estabelecendo uma lista de órgãos obrigatórios:

a) Assembleia geral;

b) Presidente;

c) Direção;

d) Conselho Fiscal

e) Conselho de disciplina;

f) Conselho de justiça;

g) Conselho de arbitragem.

 

Ora, neste âmbito, é o capítulo IV dos Estatutos da FPF, que se ocupa da matéria relativa à sua organização. Diz-nos o artigo 20.º que são órgãos sociais da FPF:

a) a Assembleia geral (regulado nos artigos 35.º e seguintes);

b) o Presidente (regulado no artigo 48.º);

c) a Direção (regulado nos artigos 49.º e seguintes);

d) o Conselho fiscal (regulado nos artigos 54.º e seguintes);

e) o Conselho de disciplina (regulado nos artigos 57.º e seguintes);

f) o Conselho de justiça (regulado nos artigos 59.º e seguintes);

g) o Conselho de arbitragem (regulado nos artigos 61.º e seguintes).

Note-se que o nº3 do mesmo artigo diz que cada órgão elabora o seu próprio regimento interno, sujeito à aprovação da Direção.

 

  1. Conclusão

Por forma a finalizar o presente texto, conclui-se que a Federação Portuguesa de Futebol é uma associação de direito privado, sem fins lucrativos e com reconhecimento de utilidade pública desportiva. É uma associação porque a sua génese contempla diversas associações de futebol distritais ou regionais, a Liga Portuguesa de Futebol Profissional, as várias organizações, representativas de agentes desportivos e as entidades com contributo no desenvolvimento do futebol, qualificadas como sócios ordinários da FPF pelo artigo 10.º, nº 2 dos seus Estatutos.

O seu principal regime jurídico está contido em legislação específica para federações desportivas e ainda por normas de direito privado que se aplicam à generalidade das associações sem fins lucrativos.

Verifica-se que, de facto, no plano desportivo, a FPF tem um papel ativo e fundamental para a promoção, regulação, direção e desenvolvimento do ensino da prática do futebol, tanto a nível nacional como internacional.

 

Legislação:

- Estatutos e Regulamento Eleitoral da Federação Portuguesa de Futebol;

- Despacho nº 5331/2013, referente à utilidade pública desportiva;

- Decreto-Lei 248-B/2008, de 31 de dezembro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei 93/2014, de 23 de junho;

- Código Civil;

Toda a informação foi recolhida no sítio http://www.fpf.pt/pt/ , mais concretamente na área da documentação.

 

Tomás Duarte, nº 24275 (10B)

Princípios Constitucionais sobre Organização Administrativa

Na nossa Constituição, mais precisamente no artigo 267º/nº1 e 2, estão consagrados vários princípios constitucionais acerca da organização da Administração:

Artigo 267.º
Estrutura da Administração

  1. A Administração Pública será estruturada de modo a evitar a burocratização, a aproximar os serviços das populações e a assegurar a participação dos interessados na sua gestão efetiva, designadamente por intermédio de associações públicas, organizações de moradores e outras formas de representação democrática.
  2. Para efeito do disposto no número anterior, a lei estabelecerá adequadas formas de descentralização e desconcentração administrativas, sem prejuízo da necessária eficácia e unidade de ação da Administração e dos poderes de direção, superintendência e tutela dos órgãos competentes.

(…)

 

O Professor Freitas do Amaral retira das disposições apresentadas cinco princípios, que iremos desenvolver de seguida:

                               - Princípio da desburocratização;

                               - Principio da aproximação dos serviços às populações;

                               - Princípio da participação dos interessados na gestão da Administração Pública;

                               - Princípio da descentralização;

                               - Princípio da desconcentração;

 

1: Princípio da desburocratização

                Relacionado com o conceito de eficiência, o princípio da desburocratização diz respeito ao dever da Administração em facilitar a relação com os particulares em tanto quanto conseguir, evitando burocracias excessivas. Aqui o objetivo é diminuir ao máximo os entraves na relação entre os particulares e Administração que a burocracia cria e impor ao legislador uma organização da Administração Pública que seja eficiente e não excessivamente complexa.   

 

2: Principio da aproximação dos serviços às populações

                Este princípio visa assegurar a aproximação dos serviços públicos aos particulares, no sentido em que tais serviços devem abranger devidamente as populações residentes nos diversos pontos do país. No entanto, aqui enquadra-se também uma aproximação num segundo sentido, de acordo com o qual a aproximação deve ser feita no intuito de ouvir a opinião dos particulares, as suas recomendações, queixas e aspirações. Desta forma, conseguem de forma concreta influenciar a atuação do aparelho administrativo do Estado. 

 

3: Princípio da participação dos interessados na gestão da Administração Pública

                Significa este princípio que, para além da intervenção dos particulares na Administração Pública pela eleição dos ocupantes dos cargos, a população envolve-se no próprio funcionamento da Administração, na formação das decisões dos órgãos. Assim os interessados não têm de esperar por uma nova época eleitoral para se fazerem ouvir.

                Assentando no princípio da democracia direta, existem dois mecanismos que concretizam o princípio em questão:

                               - A obrigatoriedade da existência de órgãos consultivos que coadjuvam a formação da vontade do órgão;

                               - As obrigações decorrentes dos princípios da colaboração com os particulares (artigo 11º CPA) e do princípio da participação dos particulares na formação de decisões (artigo 12º CPA).         

 

4: Princípio da descentralização

                No sentido de recusar a centralização da Administração, este princípio tem como objetivo aproximar o exercício do poder aos cidadãos, bem como o exercício do poder de acordo com as especificidades regionais dos vários pontos do país. Deste modo, existem então autarquias locais, que através das suas atribuições prosseguem interesses de populações de certas circunscrições territoriais, que podem não corresponder aos interesses que seriam defendidos num exercício centralizado do poder.  

 

5: Princípio da desconcentração

                Por fim, o princípio da desconcentração tem como objetivo evitar que o poder esteja concentrado numa ou num grupo de pessoas. Assim, o poder é repartido, através de desconcentração legal (nas competências dos órgãos) ou através de delegação de poderes. Ficam então criados mais centros de decisão, consagrando, primariamente, o princípio da separação de poderes, por forma a evitar o arbítrio proveniente de apenas um centro de poder, como acontecia no Estado absoluto.  

 

                No entanto, e para finalizar, estes princípios não devem ser considerados absolutos, uma vez que o próprio nº2 do artigo 267º da CRP lhes impõe limitações “… sem prejuízo da necessária eficácia e unidade de ação da Administração e dos poderes de direção, superintendência e tutela dos órgãos competentes.”. Assim devem-se equilibrar e articular os princípios aqui apresentados com o da eficácia da Administração.    

 

Bibliografia

 

- Diogo Freitas do Amaral, "Curso de Direito Administrativo", volume I, 4ª edição, Almedina, Coimbra, 2015

 

Francisco Horta Caetano – Nº28147      

A Administração Pública no Estado Liberal

Por Administração Pública entende-se que esta é o conjunto das normas, lei e funções desempenhadas para organizar a administração do Estado em todas as suas instâncias e tem como principal objectivo o interesse público. A Administração pode assumir duas vertentes: a primeira é a ideia de servir e executar e a segunda envolve a ideia de direcção ou gestão. Nas duas visões há a presença da relação de subordinação e hierarquia. Administrar significa não só prestar serviços e executá-los, como também governar e exercer a vontade com o objectivo de obter um resultado útil à colectividade. Significa também planear e elaborar acções no sentido de enfrentar os problemas vividos diariamente pela sociedade, ou seja, elaborar políticas públicas que possam orientar as acções governamentais.Entende-se então que, Administração Pública é a actividade do Estado.

A evolução constitucional do Estado Moderno passou por três diferentes paradigmas constitucionais, que se distanciam em diversos aspectos, em virtude do momento histórico e social vivenciado por cada um desses.

No que diz respeito à relação destes Estados com a sociedade civil verifica-se no Estado Liberal, em virtude da forma de seu surgimento, em oposição da nova classe burguesa ao antigo regime opressor, uma ampliação da participação da sociedade, com a consolidação dos direitos fundamentais.

Ao Estado competia apenas a manutenção da ordem interna e da soberania, que fica sobre a alçada da sociedade de todos os demais aspectos, em especial daqueles relacionados com a economia. Tinha-se como principal objectivo a proteção da liberdade e da propriedade dos cidadãos, submetendo a actuação do Estado e da Administração Pública a uma limitação das suas funções, ficando a AP com a função de aplicar as leis.

A Constituição da época visou à institucionalização de uma ordem jurídica que restringisse o poder Estatal às funções da garantia da ordem social, da defesa externa e da administração da justiça, mas em contrapartida consagrou princípios como a igualdade formal, a separação de poderes, a protecção da propriedade privada e a legalidade.

Diferentemente, no Estado Social, o Estado e a Administração Pública ganham uma maior importância no seu papel, com a aproximação da sociedade. Altera-se a regulação estatal sobre a economia, com uma maior intervenção, bem como os direitos fundamentais, que ganham aspectos sociais.

A Administração Pública aumenta as suas atribuições, com o controlo estatal sobre o sistema financeiro e de trabalho, aumentando, desta forma, as actividades assumidas pelo Estado. Em oposição, o papel do indivíduo é diminuído, através das intervenções do mesmo.

No Estado Liberal(surgiu nos fins do séc. XVIII-XIX), há a consolidação dos direitos fundamentais, a partir da salvaguarda dos direitos pessoais, sobretudo com a proteção da liberdade e da propriedade dos cidadãos. Estes são denominados direitos de primeira geração, ou negativos, já que visaram, sobretudo, limitar a actuação Estatal sobre a vida particular, permitindo uma maior autonomia individual, especialmente na área económica. Destes direitos fazem parte os direitos civis ou políticos, relacionados com a vida, liberdade, propriedade e igualdade formal.

Pelo contrário, no Estado Social aumentam-se os direitos fundamentais, que ganham aspectos sociais. Estes são chamados de direitos de segunda geração, direitos colectivos e sociais. Possuem uma dimensão positiva, visam impulsionar o Estado a efectivar o bem-estar social, e relacionam-se com o trabalho, a habitação, a saúde, a educação e o lazer.

Por fim, no Estado Democrático de Direito dá-se a consolidação da participação dos cidadãos na vida política, jurídica e social, com a concretização dos direitos difusos e pessoais homogéneos. São estes designados por direitos de terceira geração, relacionados ao direito à paz, à autodeterminação dos povos, ao meio ambiente, à conservação do património histórico, cultural e comunicação, também podem ser designados como direitos de solidariedade e fraternidade, visto que se destinam à colectividade.

Assim, a partir do Estado Democrático de Direito o ordenamento jurídico ganha novos contornos, com o reforço da ideia de segurança jurídica aliada à ideia de justiça, ou seja, na aplicação do direito ao caso concreto deve-se interpretar o direito tendo em consideração não só as leis existentes, mas também os princípios constitucionais, para assim encontrar a norma adequada, que traga justiça ao caso concreto. Desta forma, devem ser consideradas não só as regras estabelecidas, mas, sobretudo, os princípios constitucionais, que serão aplicáveis aos indivíduos e ao Estado.

O Prof. VASCO PEREIRA DA SIVA entende que o modelo de administração pública do Estado liberal caracterizava-se por fazer do acto administrativo o seu modo quase exclusivo de agir, quanto a organização administrativa por apresentar uma estrutura concentrada e centralizada e relativamente à fiscalização dessa actividade, pelo sistema da justiça delegada.

O Prof. VASCO PEREIRA DA SILVA entende também que a organização administrativa do Estado liberal pode ser caracterizada pela concentração e centralização, pois o Estado liberal vai herdar do seu antecessor a organização centralizada do poder. A razão de ser deste modelo prende-se ao facto do liberalismo pretender dar respostas a algumas exigências políticas, como a burguesia que precisava de uma estrutura racional e centralizada para eliminar as disparidades locais e conseguir formação de um mercado nacional, bem como eliminar os entraves feudais e também precisava de uma administração robusta e energética que procedesse a criação das infra estruturas e servições necessários para potenciar a actividade económica e que permitisse a instauração da ordem política e económica do liberalismo. O liberalismo procurou criar uma estrutura administrativa racional e eficiente, que lhe permitisse a realização do seu programa político, neste modelo o poder público é organizado como um corpo unitário, igualmente difundido pelo centro e pela periferia, distribuído por matérias ou grupos de matérias, a administração adquiriu assim uma estrutura unificada e hierarquizada, em que as competências dos diversos órgãos se encontram encadeadas à semelhança de uma pirâmide.

O Estado Liberal vai procurar, através do seu modelo de justiça delegada, conciliar os interesses da administração com a protecção dos particulares, a ideia de controlo da administração por uma entidade independente, mas com poderes limitados, correspondia ao ambiente de direito do Estado liberal.  

Por um lado assegurava-se a primazia da administração, através da sua fiscalização por um órgão que apesar de exercer uma função jurisdicional, integrava-se no poder administrativo e cujos poderes de fiscalização limitavam-se à anulação dos actos administrativos, por outro lado, garantia-se a protecção dos direitos individuais, a qual era realizada sobretudo através da lei e não de meios jurisdicionais.

Para os liberais a administração devia submeter-se ao princípio da legalidade, entendendo-se que a melhor defesa dos direitos dos cidadãos era a que provinha da lei, enquanto manifestação da vontade geral.

Helena Freitas, nº26073

TB10

 

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