1. «Administração Pública» enquanto expressão polissémica
Consagra o art. 266º/1 CRP que "A Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos". Ora, desde logo podemos concluir que incumbe à Administração Pública a satisfação de necessidades colectivas de modo a prosseguir o interesse público, isto é, o interesse da comunidade (o «bem comum»). Essa tarefa de prossecução do interesse público cabe a um conjunto de órgãos, serviços e agentes públicos devidamente regulado e organizado.
De um modo bastante consensual, a actual doutrina administrativa (neste sentido, cfr. FREITAS DO AMARAL, JOÃO CAUPERS e REBELO DE SOUSA / SALGADO DE MATOS) encara «administração pública» como uma expressão polissémica, que pode ser apresentada em diversos sentidos, nomeadamente em sentido orgânico, quando nos referimos à Administração Pública enquanto organização ou conjunto de órgãos, serviços e agentes públicos; ou em sentido material, quando utilizada em sentido de actividade ou de operações realizadas pelos órgãos, serviços e agentes públicos com vista à satisfação regular de necessidades colectivas.
Interessa-nos agora, porém, um terceiro sentido do conceito de administração pública, que é o sentido formal: a Administração Pública enquanto poder público. Dizem REBELO DE SOUSA e SALGADO DE MATOS: "Na doutrina portuguesa, o sentido formal de administração pública exprime usualmente os modos de actuação da administração pública em sentido orgânico, quando exerce a administração pública em sentido material e usa poderes que lhe dão supremacia sobre os cidadãos". Ou seja, estamos perante uma administração pública enquanto autoridade e que, tal como refere MARCELLO CAETANO, "deixa de se caracterizar como função para se afirmar como poder".
Assim, podemos entender a Administração Pública enquanto poder administrativo: "sistema de órgãos do Estado e das entidades públicas menores que se caracteriza pela faculdade de, com base nas leis e sob o controlo dos tribunais competentes, estabelecer normas jurídicas e tomar decisões, em termos obrigatórios para os respetivos destinatários, estando-lhe confiado o monopólio do uso legítimo da força pública (militar ou policial), a fim de assegurar a execução coerciva quer das suas próprias normas e decisões, quer das normas e decisões dos outros poderes do Estado (leis e sentenças)" (cfr. FREITAS DO AMARAL).
2. O conceito de relação jurídica administrativa
O art. 212º/3 CRP estatui que "Compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais". Surge-nos, deste modo, o conceito de relação jurídica administrativa como modo de definir o âmbito da justiça administrativa, segundo a Constituição.
Ao longo dos tempos, tem havido uma evolução da doutrina de Direito Administrativo relativamente a este conceito. De facto, como nos aponta JOÃO CAUPERS: "As explicações tradicionais do direito administrativo português não continham, em regra, qualquer referência à existência de relações jurídico-administrativas". Ora, na época do Estado Liberal (séc. XIX), estávamos perante um Estado mínimo e uma Administração fundamentalmente autoritária e agressiva, sendo o particular considerado um "objecto" do poder soberano, destituído de direitos subjectivos. A Administração Pública modificava unilateralmente as esferas dos particulares, sujeitos à sua actuação, através do acto administrativo, que era considerado a figura central do Direito Administrativo nesta época.
Porém, ao longo do século XX, a Administração Pública evolui de uma Administração autoritária para uma Administração prestadora de serviços aos particulares. A actual Constituição da República Portuguesa afasta ainda a hipótese de o indivíduo, enquanto sujeito de Direito, ser tratado como mero objecto dos poderes públicos; este torna-se verdadeira parte do procedimento administrativo, com direitos e garantias face à Administração e aos restantes poderes públicos, como consagrado nos arts. 20º/1, 48º e 268º CRP. Deste modo, face aos inúmeros problemas do Direito Administrativo moderno, a dogmática do acto administrativo deixa de ser suficiente e a base fundamental da dogmática deste ramo do Direito passa a ser a relação jurídica administrativa.
Como refere VASCO PEREIRA DA SILVA: "A relação jurídica apresenta, assim, a vantagem dogmática de possuir um âmbito de aplicação muito maior do que o do acto administrativo, capaz de englobar todas as decisões unilaterais (individuais e concretas) da Administração - e permitindo ainda o enquadramento teórico dos direitos e deveres dos sujeitos jurídicos, anteriores ou posteriores a esses actos -, assim como de abranger também todas as demais situações em que estejam estabelecidas ligações jurídicas entre as autoridades administrativas e os particulares". Este autor defende ainda esta dogmática da relação jurídica visto que, de acordo com esta, "o privado encontra-se perante a Administração, não como objecto de um poder administrativo - um simples "administrado" -, mas como um autónomo sujeito jurídico, que ocupa no mundo do direito uma posição igual à Administração".
No mesmo sentido de JOÃO CAUPERS, não concordamos inteiramente com a afirmação supra transcrita, isto porque a Administração Pública, no seu sentido formal, consiste num poder público, dotado de autoridade e, como tal, não podemos considerar que esta esteja, de um modo geral, numa situação de paridade com os cidadãos. Tal não significa, porém, que não possam existir relações tendencialmente paritárias entre Administração Pública e particulares, dado o aumento de direitos dos cidadãos face à Administração e de deveres desta para com os privados.
Relativamente à definição do conceito de relação jurídica administrativa, existem várias na doutrina administrativa portuguesa. Para FREITAS DO AMARAL, trata-se de "toda a relação entre sujeitos de direito, públicos ou privados, que atuem no exercício de poderes ou deveres públicos, conferidos por normas de direito administrativo". Já VIEIRA DE ANDRADE, por sua vez, segue um critério estatutário, definindo a relação jurídica de Direito Administrativo como uma relação jurídica de direito público, na qual "um dos sujeitos, pelo menos, seja uma entidade pública ou uma entidade particular no exercício de um poder público ou de um dever público, conferido ou imposto com vista à realização de um interesse público legalmente definido".
3. O Poder Administrativo
Tal como foi supra mencionado, a Administração Pública pode ser entendida como poder administrativo, isto é, como um sistema de órgãos e de agentes públicos que actuam com poderes exorbitantes ou de autoridade, criando situações jurídicas passivas ou de desvantagem do lado dos particulares, como deveres, sujeições ou ónus (Exemplo: a Administração unilateralmente determina o montante de imposto devido por cada contribuinte).
É, no entanto, importante referir que este poder administrativo não é arbitrário, pois é pautado por diversos princípios que deve seguir ao satisfazer as necessidades da colectividade. Por força do art. 266º/2 CRP, "Os órgãos e agentes estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé". O nº1 do mesmo artigo refere ainda o princípio da prossecução do interesse público, o qual constitui, segundo JOÃO CAUPERS, "o verdadeiro fio condutor da actividade administrativa pública".
Assim, concluímos que a Administração Pública dispõe de poderes públicos de índole geral, que são verdadeiros poderes-deveres ou poderes funcionais (neste sentido, cfr. VIEIRA DE ANDRADE), pois são de exercício vinculado e imprescritíveis, dado protegerem interesses de terceiros ou, neste caso, da colectividade - interesse público. Mais ainda, tratam-se de poderes que devem obediência à lei - princípio da legalidade - e, portanto, a Administração Pública apenas pode actuar dentro dos limites da lei, não obstante a possibilidade de o legislador conferir alguma margem de livre actuação e de decisão, isto é, de discricionariedade à Administração.
De qualquer modo, são diversas as manifestações do poder administrativo, sendo que actualmente FREITAS DO AMARAL aponta como principais cinco manifestações: o poder regulamentar, o poder de decisão unilateral, o poder de execução coerciva, o conjunto de poderes especiais do contraente público nos contratos administrativos e o conjunto de poderes especiais das autoridades de polícia.
3.1. O Poder Regulamentar
No nosso sistema administrativo, a Administração Pública tem faculdade regulamentária, ou seja, poder de fazer regulamentos, por força dos arts. 199º-c), 227º/1-d) e 241º CRP. Tratando-se de um poder público, a Administração "goza da prerrogativa de definir unilateral e previamente, em termos genéricos e abstratos, em que sentido é que vai interpretar e aplicar as leis em vigor" (cfr. FREITAS DO AMARAL).
Os regulamentos têm eficácia externa vinculativa e, como tal, constituem fontes de direito. Em todo o caso, como dizem REBELO DE SOUSA e SALGADO DE MATOS, "não incorporam decisões essenciais para a colectividade política, o que os aparta da lei; e estão sujeitos ao princípio da legalidade, o que significa que têm que se fundamentar numa lei habilitante e que têm como limites a Constituição, o direito internacional e comunitário e a lei, que não podem contrariar".
3.2. O Poder de Decisão Unilateral
Nesta situação, a Administração tem o poder de definir unilateralmente (isto é, por exclusiva autoridade sua e sem necessidade de autorização ou acordo com o interessado) o direito aplicável a um caso concreto, sendo essa definição unilateral obrigatória para os particulares. Como refere MARCELLO CAETANO, a Administração Pública tem "a possibilidade de traçar a sua própria conduta ou a conduta alheia independentemente do recurso aos tribunais".
Contudo, JOÃO CAUPERS, seguindo a perspectiva de PEDRO MACHETE, considera que a Administração Pública de hoje é cada vez menos caracterizada pela decisão unilateral e autoritária, substituíndo-se pela decisão negociada com os cidadãos afectados (cfr. art. 100º CPA, relativo à possibilidade de audiência dos interessados). Trata-se, portanto, de uma administração participada, concertada ou contratualizada, segundo estes autores.
FREITAS DO AMARAL, por sua vez, não nega a existência de garantias administrativas impugnatórias dos particulares face à Administração (arts. 121º e ss., 184º e ss. CPA). Porém, estas garantias só são exercidas depois da decisão unilateral já existir, não cabendo à Administração ter de ir a tribunal para legitimar a sua decisão; é, pois, ao particular que incumbe o ónus de impugnar a decisão.
3.3. O Poder de Execução Coerciva
Originalmente designado privilégio de execução prévia por MARCELLO CAETANO, consiste no "poder conferido à Administração Pública de, uma vez definido o direito aplicável ao caso, impor as consequências de tal definição aos seus destinatários, mesmo contra a oposição destes e sem a prévia intervenção de um tribunal (execução coerciva por via administrativa)" (cfr. JOÃO CAUPERS).
A expressão «privilégio de execução prévia» tem sido criticada por alguns autores, nomeadamente por VASCO PEREIRA DA SILVA e por FREITAS DO AMARAL, sendo que este último prefere adoptar o termo poder de execução coerciva, visto que se trata de um poder e não de um «privilégio», por ser atribuído legalmente a quase todas as entidades públicas.
A Administração Pública decide unilateralmente o direito aplicável a um caso concreto e, a partir desse momento, pode exigir do particular que cumpra o dever ou encargo que lhe foi eficazmente definido, tendo o direito de executar coactivamente (sem recurso prévio aos tribunais) a decisão que ela própria efectuou em caso de incumprimento da parte do particular. Não obstante, a Administração só pode exercer este poder "segundo as formas e termos expressamente previstos na lei", à luz do art. 176º/1 CPA - princípio da tipificação das medidas de execução.
3.4. Conjunto de Poderes Especiais do Contraente Público nos Contratos Administrativos
Para SÉRVULO CORREIA, o contrato administrativo consiste num "processo próprio de agir da Administração que cria, modifica ou extingue relações jurídicas, disciplinadas em termos específicos do sujeito administrativo, entre pessoas colectivas da Administração ou entre a Administração e os particulares". O artigo 1º/6 CCP define o contrato administrativo como "acordo de vontades, independentemente da sua forma ou designação, celebrado entre contraentes públicos e co-contratantes ou somente entre contraentes públicos".
De facto, existem situações em que não é conveniente a actuação da Administração Pública por via do acto administrativo, enquanto decisão unilateral e autoritária. Por vezes, é necessário um acordo entre os interessados e, assim, a Administração exerce o seu poder administrativo no âmbito da figura do contrato.
O contrato administrativo apresenta, no entanto, um regime diferente dos contratos em direito privado. Em primeiro lugar, a Administração Pública, de modo a prosseguir o interesse público, dispõe de direitos e poderes que as partes em contratos privados não dispõem (exemplo: poder de rescindir o contrato por conveniência do interesse público). No entanto, a Administração também fica sujeita a restrições e deveres especiais não existentes nos contratos entre privados (exemplo: dever de fazer preceder a celebração do contrato de um procedimento administrativo tendente à escolha do co-contratante).
3.5. Conjunto dos Poderes Especiais das Autoridades de Polícia
As autoridades policiais (PSP, GNR, SEF, ASAE, etc.) têm como principais funções a defesa da legalidade democrática, manter a ordem pública, assegurar o normal exercício dos direitos fundamentais dos cidadãos e proceder à prevenção e investigação criminal, como consagram os arts. 199º-f), 219º/1 e 272º CRP. Segundo JOÃO RAPOSO, estes poderes policiais, em algumas circunstâncias, "compreendem a coacção directa (isto é, o emprego da força física) contra os prevaricadores".
Tratam-se, segundo FREITAS DO AMARAL, da "demonstração mais evidente, mais forte e mais perigosa de que a Administração é, na realidade, um verdadeiro Poder". Isto porque os poderes de polícia são, em primeiro lugar, de natureza unilateral, insusceptíveis de negociação ou de compromisso. Além disso, muitas vezes, o exercício destes poderes não está sujeito a regras procedimentais dada a urgência do seu exercício e à natureza humanamente exigente das actividades e operações realizadas e, portanto, são também poderes insusceptíveis de serem concedidos a particulares.
4. Garantias Administrativas dos Particulares
O Direito Administrativo faculta aos particulares meios jurídicos de defesa contra abusos da Administração Pública, ou seja, garantias. Dentro das garantias, destacam-se as garantias administrativas, que se efectivam através da actuação e da decisão dos órgãos da Administração Pública. A ideia subjacente é a de, existindo certos controlos criados por lei para defesa da legalidade e da boa administração, a lei permitir que esses controlos se coloquem simultaneamente ao serviço dos direitos subjectivos ou dos interesses legítimos dos particulares.
Para além destas, existem garantias contenciosas ou de contencioso administrativo, que consistem em garantias dos particulares que se efectivam através dos tribunais. Este tipo de garantias não será alvo de análise no presente trabalho dada a ampla e diversificada lista de espécies de espécies de contencioso que existem em consequência de duas reformas importantes do contencioso administrativo, operadas em 2002-2004 (neste sentido, cfr. FREITAS DO AMARAL).
4.1. Garantias petitórias
As garantias petitórias têm por base um pedido, não pressupondo a prévia prática de um acto administrativo. Teremos em consideração cinco tipos de garantias de tipo petitório, nomeadamente:
- direito de petição - faculdade de solicitar aos órgãos da Administração Pública providências que se consideram necessárias, como tomada de decisões ou prestação de informações (exemplo: direito de os cidadãos serem esclarecidos sobre actos do Estado e demais entidades públicas - art. 48º/2 CRP);
- direito de representação - faculdade de alertar um órgão da Administração Pública responsável por uma determinada decisão administrativa para as consequências prováveis da mesma (exemplo: direito que funcionários podem exercer quando duvidam da autenticidade de uma ordem dos seus superiores hierárquicos);
- direito de denúncia - faculdade de chamar a atenção de um órgão da Administração Pública para um facto ou situação que esta tenha a obrigação de averiguar (exemplo: quando se tem conhecimento de um crime e se faz a respectiva denúncia à PJ ou ao Ministério Público);
- direito de queixa - faculdade de denunciar o comportamento de um funcionário ou agente da Administração Pública, com o objectivo que se proceda ao apuramento da responsabilidade disciplinar deste (exemplo: queixa de um funcionário público, desencandeando-se um processo disciplinar);
- direito de oposição administrativa - faculdade de contestar decisões que um órgão da Administração Pública projecta tomar, seja por sua iniciativa, seja dando satisfação a pedidos que lhe tenham sido dirigidos por particulares (exemplo: direito de certas pessoas e entidades deduzirem oposição a um projecto da Administração de construção numa dada área).
4.2. Garantias impugnatórias
Diferentemente das garantias petitórias, as garantias impugnatórias pressupõem sempre um acto administrativo prévio que se pretende atacar com certos fundamentos, visando a sua revogação, anulação administrativa ou modificação (art. 184º CPA). Existem quatro tipos de garantias de tipo impugnatório (cfr. arts. 191º a 199º CPA):
- reclamação - pedido de reapreciação do acto administrativo dirigido ao seu autor (art. 191º/1 CPA);
- recurso hierárquico - pedido de reapreciação do acto administrativo dirigido ao superior hierárquico do seu autor (art. 193º/1 CPA);
- recurso hierárquico impróprio - pedido de reapreciação de um acto administrativo dirigido a um órgão da mesma entidade pública a que pertence o autor do acto recorrido e que exerce sobre este um poder de supervisão (art. 199º/1, alíneas a) e b), CPA);
- recurso tutelar - pedido de reapreciação de um acto administrativo praticado por um órgão de uma entidade pública dirigido a um órgão de outra entidade pública, que exerce sobre aquela um poder de superintendência ou de tutela (art. 199º/1, alínea c), CPA).
4.3. A queixa ao «Provedor de Justiça»
A figura do Provedor de Justiça surgiu na nossa ordem jurídica após o 25 de Abril de 1974. Consagra o art. 23º/1 CRP: "Os cidadãos podem apresentar queixas por acções ou omissões dos poderes públicos ao Provedor de Justiça, que as apreciará sem poder decisório, dirigindo aos órgãos competentes as recomendações necessárias para prevenir e reparar injustiças". O nº3 do mesmo artigo qualifica-o ainda como órgão independente.
A característica mais relevante da sua intervenção é a falta de poder decisório: o Provedor de Justiça não dispõe de competência para revogar nem para modificar actos administrativos (art. 22º/1 da Lei nº 9/91), nem pode substituir-se às autoridades competentes para praticar em vez delas os actos que considere legalmente devidos.
Como observa JOÃO CAUPERS, "a «grande arma» do Provedor de Justiça é a persuasão". Este estuda cada caso concreto e, se entender que o particular tem razão na queixa, dirige recomendações às autoridades competentes. Pode ainda, segundo FREITAS DO AMARAL, usando a teoria dos poderes implícitos, dialogar com as autoridades postas em causa e «pressioná-las» para que cumpram a lei ou que corrijam os seus erros ou omissões.
A grande vantagem do Provedor de Justiça é tratar-se de um órgão do Estado com autorictas e que goza de grande prestígio e independência que fazem com que a Administração Pública tenda a seguir as suas recomendações. Trata-se de um órgão da administração central do Estado com carácter de órgão independente (neste sentido, cfr. FREITAS DO AMARAL).
5. Conclusão
Em face de todo o ora exposto, podemos concluír que a relação jurídica administrativa é o conceito base da dogmática do moderno Direito Administrativo. É graças à adopção da relação jurídica entre a Administração e os particulares que o particular se torna num sujeito jurídico autónomo com posição tendencialmente paritária à da Administração, podendo, por conseguinte, invocar os seus direitos perante os órgãos públicos. O particular, ao longo dos períodos históricos, foi adquirindo uma tutela jurídica e administrativa cada vez mais plena, tendo acesso a diversas garantias de modo a defender-se de alguns dos actos da Administração Pública.
A Administração Pública, por sua vez, é dotada de ius imperii, isto é, de poderes de autoridade que lhe conferem a faculdade de, por vezes, modificar unilateralmente a esfera jurídica dos particulares e estes, por conseguinte, apenas podem suportar essa posição jurídica passiva (isto é, de desvantagem). Concluímos, deste modo, que a Administração Pública, no seu sentido formal, é um verdadeiro poder público e administrativo, capaz de gerar deveres, obrigações, sujeições e ónus aos particulares através das suas várias manifestações.
Não obstante, a actuação da Administração Pública é pautada por diversos princípios, enumerados no art. 266º CRP, mas sendo o mais relevante de todos o da prossecução do interesse público. É dever da Administração Pública satisfazer as necessidades colectivas e nunca decair na prossecução do bem comum. Já os particulares são titulares de direitos subjectivos e de interesses legítimos que merecem tutela e, como tal, devem ser respeitados pela Administração Pública durante a sua tarefa contínua e regular de prossecução do interesse da colectividade.
Em suma, a relação jurídica administrativa entre Administração Pública e os particulares trata-se, como referiu SÉRVULO CORREIA, de "um sistema complexo de situações jurídicas activas e passivas interligadas", ou seja, de um conjunto de direitos e de deveres recíprocos entre as partes. Por um lado, temos uma Administração Pública que exerce poderes exorbitantes que criam, do outro lado da relação, deveres e sujeições aos cidadãos. Por outro, temos a existência de direitos subjectivos, interesses legítimos e de garantias administrativas que visam proteger os entes privados de actos abusivos da parte da Administração Pública, a qual tem o dever de prosseguir contínua e regularmente o interesse público, bem como um dever geral de respeito pelas posições jurídicas (activas) legalmente adquiridas pelos particulares.
O conceito de relação jurídica administrativa, enquanto fundamento do Direito Administrativo, permitiu uma maior aproximação entre cidadão e Administração Pública, que é o que se pretende num Estado de Direito Democrático como o nosso (art. 2º CRP).
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João Pinto Ramos - aluno nº 28375
2º Ano, Turma B, Subturma 10